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2019-2020: O vírus que obrigou a economia a travar
O surgimento de uma pandemia, levou a generalidade dos países a tomar medidas sanitárias que afetaram, de forma abrupta, muitas atividades económicas e as dinâmicas sociais.
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2019-2020: O vírus que obrigou a economia a travar

Esta foi uma crise sem paralelo em vários aspectos fundamentais. Em primeiro lugar, as suas causas foram exteriores à economia. A partir dessa origem invulgar, também a amplitude, a duração e algumas consequências desta recessão foram diferentes do padrão histórico.

Esta crise não resultou de desequilíbrios ou ajustamentos internos da economia, mas sim de um choque externo que afetou a economia global: o surgimento de uma pandemia, que levou a generalidade dos Estados a tomar medidas sanitárias que afetaram de forma direta ou indireta muitas atividades económicas e dinâmicas sociais.

No último dia do ano de 2019, a Organização Mundial de Saúde foi notificada sobre a existência de uma “pneumonia viral” na província de Wuhan, na República Popular da China. O vírus, denominado “SARS-CoV-2” é responsável pela doença COVID-19 e rapidamente se espalhou por muitos países de vários continentes.
A incerteza global instalou-se, provocando uma contração do comércio internacional no primeiro trimestre de 2020. A atividade começou a desacelerar e o ponto mais alto do ciclo económico já tinha ficado para trás, marcando o início da recessão.

A epidemia alastrou rapidamente e no dia 2 de março foi confirmado o primeiro caso em Portugal. Duas semanas depois foi decretado o primeiro Estado de Emergência, com um conjunto de restrições em atividades económicas, contactos sociais e circulação de pessoas e bens com o objetivo de tentar travar o avanço do número de pessoas contaminadas e as respetivas consequências sanitárias, tais como limitações à circulação na via pública, fecho das escolas, encerramento de serviços com atendimento ao público, obrigatoriedade do teletrabalho e reposição de fronteiras terrestres.
Este primeiro período restritivo, que terminou formalmente no dia 2 de maio, provocou uma queda significativa do comércio internacional bem como do consumo de bens e serviços e teve como consequência previsível uma forte quebra do produto, que explica a maior queda do PIB real per capita de que há registo e que se fez sentir com especial amplitude no segundo trimestre de 2020.

 
Crise violenta e curta

A queda da atividade económica esteve essencialmente concentrada no consumo e no comércio internacional, que registou a maior quebra desde a II Guerra Mundial. O turismo, com peso relevante na economia portuguesa, foi das atividades mais afetadas, com efeitos prolongados para além dos períodos administrativos de restrições, dada a incerteza que sempre se manteve. O excedente da balança de viagens e turismo portuguesa caiu 62,2% entre 2019 e 2020, para 4.958 milhões de euros.
A incerteza traduziu-se também numa queda de 40% do índice de sentimento económico entre março e maio de 2020 e, aliada às restrições do comércio, restaurantes e hotéis, motivou um aumento substancial da poupança das famílias, que passou de 7,3% do rendimento disponível em 2019 para 13,1% em 2020.

As medidas de contenção tiveram impacto sanitário positivo e, após aio de 2020, com a descida do número de novas infeções, começaram a ser levantadas gradualmente as restrições à atividade económica. Por isso, no início do segundo semestre de 2020, registou-se o maior crescimento em cadeia do PIB real trimestral de que há registo, de cerca de 15%, ditando o fim da recessão causada pela pandemia de Covid-19.
Assim, a queda inédita da economia foi sucedida por uma recuperação vigorosa, marcando o carácter atípico desta crise: violenta e curta.

O turismo foi dos sectores mais afectados pela pandemia
Saldo da balança de viagens e turismo (milhões de euros) 

 
Uma recuperação com contratempos

A recuperação teve início, mas não foi isenta de “soluços”, mais uma vez determinados pelas medidas de contenção que foram sendo tomadas em função da evolução da pandemia.
As medidas mais severas ocorreram no final de 2020 e início de - como se poder ver na cronologia acima -, quando se assistiu a um aumento significativo dos números de casos, internamentos e mortes associados à Covid-19. Esta evolução, comum à generalidade dos países europeus, voltou a provocar uma contração do comércio internacional e do consumo. No entanto, o PIB real per capita caiu bem menos no primeiro trimestre de 2021 tendo em conta a extensão do vírus e das medidas de resposta, recuperou inteiramente no segundo trimestre de 2021. Por isso, e apesar da sua extensão e do forte impacto sanitário, este novo período de estado de emergência não provocou uma recessão na economia portuguesa. A queda do PIB foi menor do que a verificada durante o primeiro Estado de Emergência e a sua recuperação foi ainda mais rápida.

As primeiras medidas foram súbitas e muito restritivas
Índice de restrições (valores diários, média móvel 7 dias) 

 
Os principais indicadores

PIB per capita

A queda da economia, medida pelo PIB real per capita, foi de 19,2% entre o ponto mais alto e o mais baixo do ciclo económico. O valor máximo deste ciclo económico foi atingido no último trimestre de 2019. No segundo trimestre de 2020, deu-se uma forte queda que levou ao ponto mais baixo da crise.

 

Euros (€), encadeados em volume (chain-weighted), base 2016

 

Índice de Sentimento Económico

O sentimento económico teve uma queda acentuada ao longo de todo o primeiro semestre de 2020, refletindo a elevada incerteza dos agentes económicos. No caso dos consumidores, essa incerteza teve impacto nos baixos níveis de consumo.

 

Índice, Média Móvel 9 meses, 100=outubro 2019

 

Exportações e Importações

A contração do comércio internacional levou à maior quebra das trocas de bens e serviços desde a II Guerra. O valor mínimo deste período foi atingido no segundo trimestre de 2020, mas, mesmo depois disso, continuou abaixo dos níveis habituais antes da pandemia.

 

Milhares de Milhões de Euros (€), Exportações + Importações

 
O impacto invulgar no mercado de trabalho

As consequências desta crise foram também atípicas nalguns impactos que provocou, sobretudo por causa das medidas de políticas públicas tomadas para mitigar os seus efeitos.

A evolução do mercado de trabalho será o caso mais evidente. O impacto no desemprego foi invulgar, devido à criação do regime simplificado de “layoff” que permitiu que muitos trabalhadores mantivessem o posto de trabalho mesmo não estando a trabalhar por força das medidas de contenção da pandemia. O Estado suportou uma parte destes encargos. Isso levou ao registo mais elevado de sempre do número de empresas neste regime laboral.

Só depois do fim do primeiro Estado de Emergência e da cava identificada nesta recessão - segundo trimestre de 2020 - é que a taxa de desemprego começou a refletir a contração da atividade económica. A evolução das horas trabalhadas foi, nesse sentido, um indicador que acompanhou de forma mais consistente a evolução do produto.

De igual forma, a criação de vários regimes excecionais de moratórias de crédito amorteceu o impacto desta crise no cumprimento das obrigações de crédito de empresas e famílias.

Também ao contrário do que é normal nas recessões, a construção civil praticamente não se contraiu.

 

Foi uma recessão abrupta mas também muito rápida.
Professor na Nova School of Business and Economics
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A recessão de 2019-2020 vista por José Tavares, Professor na Nova School of Business and Economics
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