Direitos e Deveres
A lei portuguesa permite realizar acções encobertas, mas não acções provocadoras.
As acções «encobertas» ou «infiltradas» são um meio de obtenção de prova regulado em lei especial. Normalmente levadas a cabo por funcionários de investigação criminal ou por terceiros actuando sob controlo da Polícia Judiciária, também podem ser realizadas por funcionários de investigação criminal de outros Estados, a pedido destes e ao abrigo de um acordo internacional que o permita, com garantia de reciprocidade.
Em Portugal, a possibilidade de realizar estas acções foi inicialmente introduzida no âmbito de crimes relacionados com o tráfico de droga, estendendo-se depois à criminalidade económica e financeira. Hoje podem realizar-se acções encobertas para um conjunto alargado de crimes de certa gravidade. A lei isenta os agentes encobertos de responsabilidade criminal quando tenham de tomar parte nos crimes praticados pelas pessoas sob investigação, desde que se mantenham dentro de certos limites.
Estas acções têm de ser adequadas aos fins de prevenção e repressão criminais visados (por ex., a obtenção de prova) e de ser proporcionais não só àqueles fins como também à gravidade do crime sob investigação. Se a acção encoberta for repressiva (ou seja, se visar a investigação e punição de crimes no contexto de um processo penal que se encontra em curso), a sua realização depende de prévia autorização do Ministério Público e de posterior validação pelo juiz de instrução. Se for preventiva (caso em que não foi instaurado ainda um processo penal), depende de autorização do juiz de instrução.
Por contraste, é proibida a realização de acções «provocadoras», mediante as quais o agente encoberto leva alguém a cometer um crime para o fazer incorrer em responsabilidade criminal (por ex., solicitando-lhe que obtenha de terceiros certa quantidade de estupefacientes). Trata-se de um método proibido de prova e as provas assim obtidas não podem ser utilizadas contra o arguido. Podem, contudo, ser usadas para estabelecer a responsabilidade criminal do agente provocador.
CRIM
O conteúdo desta página tem um fim meramente informativo. A Fundação Francisco Manuel dos Santos não presta apoio jurídico especializado. Para esse efeito deverá consultar profissionais na área jurídica.
Código de Processo Penal, artigo 126.º, n.os 2, a), e 4
Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, , alterada pela Lei n.º 87/2021 de 15 de dezembro, artigo 160.º-B
Lei n.º 101/2001, de 25 de Agosto, alterada pela Lei n.º 2/2023, de 16 de janeiro
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de Março de 2011 (processo n.º 182/09.6JELSB.L1-5)
As escutas só podem ser realizadas se se reunir um conjunto de condições bastante exigente (como não poderia deixar de ser, dada a natureza constitucional da inviolabilidade dos meios de comunicação privada). Assim, só se podem realizar escutas quando estiverem em causa certos crimes com um mínimo de gravidade. As escutas só são autorizadas se forem indispensáveis para descobrir a verdade ou se fosse impossível ou muito difícil obter prova de outro modo. A autorização tem de ser dada por despacho fundamentado do juiz de instrução, após requerimento do Ministério Público.
Por outro lado, só se efectuam escutas contra suspeitos e arguidos ou quem seja seu intermediário. As vítimas de crimes também podem ser escutadas, se o consentirem. É proibido escutar comunicações entre o arguido e o seu defensor, salvo se o juiz tiver fundadas razões para crer que as mesmas constituem, elas próprias, objecto ou elemento de um crime. As escutas são autorizadas pelo prazo máximo de três meses, mas este prazo é renovável por períodos iguais.
Além disso, há várias formalidades que as operações de escuta têm de seguir. O órgão de polícia criminal que as realizar deve levar ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias, os correspondentes suportes técnicos, autos e relatórios. Por sua vez, o Ministério Público deve levar esses elementos ao conhecimento do juiz no prazo máximo de 48 horas, devendo o juiz determinar a destruição imediata de certos elementos manifestamente estranhos ao processo (incluindo aqueles cuja divulgação possa afectar gravemente os direitos das pessoas). A partir do encerramento do inquérito, o assistente e o arguido podem examinar os suportes técnicos das conversações ou comunicações e obter, à sua custa, cópias deles.
Podem valer como prova as conversações e comunicações que o Ministério Público mande transcrever pelo órgão de polícia criminal que as tenha efectuado e que o próprio Ministério Público indique como meio de prova na acusação, bem como aquelas que o arguido e/ou o assistente transcreverem a partir das cópias que obtiverem e juntarem ao processo.
CRIM
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Constituição da República Portuguesa, artigos 32.º, n.º 2, e 34.º
Código de Processo Penal, artigos 127.º e 187.º e seguintes
Sim, uma pessoa pode ser revistada e a sua casa pode ser objecto de uma busca contra a sua vontade. Porém, tanto a revista como a busca têm limites definidos pela Constituição e pela lei.
As revistas são ordenadas quando há indícios de que alguém esconde na sua pessoa quaisquer objectos ou animais relacionados com um crime ou que possam servir de prova. As revistas têm de cumprir certas condições: têm de ser autorizadas ou ordenadas por despacho de uma autoridade judiciária (Ministério Público ou juiz); antes de se realizar a revista, tem de entregar-se ao visado uma cópia do despacho, no qual ele é esclarecido de que tem o direito de indicar uma pessoa da sua confiança para assistir à revista (desde que esta possa comparecer sem delonga).
As buscas são ordenadas quando há indícios de que objectos ou animais relacionados com um crime ou que possam servir de prova, ou o arguido ou outra pessoa que deva ser detida, se encontram em lugar reservado ou não livremente acessível ao público. As buscas estão sujeitas a condições semelhantes às das revistas.
Há casos excepcionais em que essas condições não têm de ser cumpridas, podendo as revistas e buscas ser realizadas pela polícia sem um despacho prévio. Isso pode suceder, verificadas certas condições, por ex., em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, detenção em flagrante delito, fuga iminente ou detenção de suspeitos e ainda naturalmente quando haja consentimento da pessoa visada. De todo o modo, exceptuados os casos de consentimento e de detenção em flagrante delito, essas revistas têm de ser imediatamente comunicadas ao juiz de instrução.
Além disso, há uma condição relativa a todas as revistas que deve sempre ser cumprida: a dignidade pessoal e, na medida do possível, o pudor do visado têm de ser respeitados.
As buscas domiciliárias estão sujeitas a regras mais exigentes do que as que regulam as demais buscas: salvas algumas excepções definidas na lei, só podem ser ordenadas ou autorizadas por um juiz e têm de ser efectuadas entre as 7 e as 21 horas.
Mais exigentes ainda são as condições que subordinam as buscas em escritório de advogado ou em consultório médico, destacando-se aí a exigência de serem presididas pessoalmente por um juiz.
CRIM
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Constituição da República Portuguesa, artigo 34.º
Código de Processo Penal, artigos 126.º; 174.º e seguintes; 251.º
Os exames são meios de obtenção de prova mediante os quais se inspeccionam os vestígios que o crime possa ter deixado e os indícios relativos ao modo como e ao lugar onde foi praticado, às pessoas que o cometeram ou sobre as quais foi cometido. São executados por órgãos de polícia criminal ou por autoridade judiciária (Ministério Público ou juiz), podem incidir sobre pessoas, lugares e coisas e podem ter lugar mesmo antes de um processo penal ser instaurado, a fim de evitar que os vestígios se apaguem ou alterem. Se alguém pretender esquivar-se ou de alguma forma obstar a qualquer exame que deva ser realizado ou a facultar coisa que deva ser examinada, pode ser obrigado por decisão de uma autoridade judiciária.
As perícias são meios de prova e realizam-se quando a percepção ou a apreciação dos factos exijam especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. Realizam-se em estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado (por ex., no Instituto Nacional de Medicina Legal, tratando-se de perícias médico-legais ou forenses). Quando tal não for possível ou conveniente, são levadas a cabo por um perito nomeado a partir das listas de peritos existentes em cada comarca ou, na sua falta ou impossibilidade de resposta em tempo útil, por pessoa de honorabilidade e de reconhecida competência na matéria em causa. Se a perícia for especialmente complexa ou exigir conhecimentos de matérias distintas, pode ser realizada por vários peritos, em moldes colegiais ou interdisciplinares.
A diferença essencial entre exames e perícias está no facto de os primeiros serem meios de obtenção de prova e as segundas serem meios de prova. Os primeiros visam recolher elementos (os vestígios) que possam vir a constituir meios de prova — por ex., a detecção de um corpo carbonizado no interior de um automóvel. As segundas constituem meios de prova e, portanto, podem servir de base, nomeadamente à decisão final de absolvição ou condenação do arguido.
Nas perícias, o que constitui meio de prova não são os vestígios ou factos em si mesmos, mas a interpretação qualificada que deles é feita por instituições ou pessoas dotadas de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos — por ex., a análise das causas que provocaram a explosão de um automóvel. A especificidade de conhecimentos que as perícias pressupõem explica ainda que a prova pericial esteja em princípio subtraída à livre apreciação do juiz, o qual só poderá divergir do juízo contido no parecer dos peritos se fundamentar devidamente essa sua discordância.
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Código de Processo Penal, artigos 151.º e seguintes; 171.º e seguintes; 249.º
Os meios de prova são os elementos que permitem afirmar a realidade dos factos relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da sanção aplicável. É com base nestes elementos que as autoridades competentes, em especial os tribunais, baseiam algumas das suas decisões, incluindo a de condenação ou absolvição do arguido. A prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
Os meios de utilização mais comum são: a prova testemunhal; as declarações do arguido, do assistente e das partes civis; a prova por acareação (um confronto entre sujeitos que prestaram declarações contraditórias); a prova por reconhecimento (a identificação e/ou descrição de uma pessoa por parte de outra); a reconstituição do facto (a reprodução, tão fiel quanto possível, das condições em que se afirma ou se supõe ter ocorrido o crime e a repetição do seu modo de realização); a prova pericial; e a prova documental.
Diversamente, os meios de obtenção de prova são as diligências realizadas pelas autoridades para recolher a prova. Alguns dos meios de obtenção de prova mais tradicionais são os exames, as revistas e buscas, as apreensões e as escutas telefónicas.
No processo penal português, são admissíveis todas as provas que não forem proibidas por lei. E a lei, em conformidade com a Constituição, proíbe as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas, bem como, ressalvados alguns casos previstos na lei (por exemplo, as buscas domiciliárias ou as escutas telefónicas), as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento da pessoa visada.
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Constituição da República Portuguesa, artigo 32.º, n.º 8
Código de Processo Penal, artigos 124.º e seguintes