Pode o destino de um país ser traçado pelas suas fronteiras naturais? O jornalista e autor britânico Tim Marshall, conhecido pelo bestseller «Prisioneiros da Geografia», leva-nos numa viagem pelo mundo real: aquele desenhado por montanhas, rios e mares que moldam não só o formato, como o poder e o comportamento das nações.
«A geografia não explica tudo, mas explica quase tudo», diz. E fá-lo com a clareza de quem já esteve em doze zonas de guerra, foi preso em Damasco, baleado no Cairo e bombardeado em Belgrado.
Para Marshall, a geografia não é um detalhe: é a estrutura invisível que define quem pode crescer, quem fica bloqueado e quem entra em confronto. «Se tens rios largos e navegáveis, cais profundos e acesso ao mar, consegues construir navios, trocar mercadorias, projetar poder», afirma. Se, por outro lado, há montanhas, costas rasas ou desertos à volta, o país está limitado desde o início.
É essa desigualdade estrutural que ajuda a explicar o sucesso dos EUA, «o país mais abençoado pela geografia», e também os comportamentos defensivos da Rússia, «presa num planalto exposto, onde a única defesa é o controlo das zonas-tampão, como a Bielorrúsia e a Ucrânia».
Portugal não escapa à análise: «Os portos de águas profundas foram uma vantagem para que o país se expandisse globalmente na era dos Descobrimentos, mas foram perdendo valor».
Hoje, «não há acesso direto ao Mediterrâneo para o comércio, nem rotas fluviais para norte», explica o especialista. «Mesmo que consigam transportar mercadorias pelos Picos da Europa, só têm um corredor estreito em Espanha como rota comercial, pois os Pirenéus bloqueiam-vos a passagem», acrescenta.
Ainda que a perda de poder e influência no mundo marque a história portuguesa, Tim Marshall garante que há algumas vantagens estratégias que precisam de ser aproveitadas. É o caso das 200 mil milhas náuticas que o país tem para, sozinho, pescar e explorar minerais e gás.
«Portugal não tem aproveitado o seu potencial em termos da exploração de minerais na imensa Zona Económica Exclusiva. E também não o tem feito na energia eólica e oceânica», esclarece, garantindo que o território português pode vir a ser «um ator de relevo» nestes dois setores.
Ao longo da conversa, Marshall fala de clima, migrações, populismo e novos pontos de tensão. E o jornalista é claro: as alterações climáticas estão já a mudar a política global. «Quando um agricultor da América Latina deixa de conseguir produzir café, muda-se para o norte. E essa migração em massa ajudou a eleger Trump».
A geopolítica do futuro, diz, não será apenas entre Estados, mas entre zonas de desespero e zonas de oportunidade. E isso obriga-nos a pensar o planeta como um todo.
Mas nem tudo está perdido. «Todos os períodos acabam por terminar. E todos os momentos de transição são caóticos. Mas conseguimos sempre atravessá-los e chegar ao outro lado». Só é preciso uma coisa: cooperação.
«The What & The Why», de Tim Marshall
Intelligence Squared: «How does geography explain the world?», com Tim Marshall
«Mais Mar do Que Terra» (Fronteiras XXI, FFMS)
«Os Portugueses desconhecem muitas histórias sobre o mar» (Atual_Mentes, FFMS)
«Como proteger e governar o oceano?» (Da Capa à Contracapa, FFMS)
«Quais os desafios da Economia Azul?» (Da Capa à Contracapa, FFMS)
«Estamos preparados para grandes inundações e cheias?» (Da Capa à Contracapa, FFMS)

Grandes temas, grandes nomes num novo programa dedicado a entrevistas com personalidades internacionais ligadas à política, economia e sociedade. Conduzidas pelo jornalista Pedro Pinto, estas conversas, com convidados especiais, querem simplificar e ajudar a desmistificar alguns dos temas mais importantes da atualidade. Todos os meses, no site da Fundação.