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Água-viva nas águas da costa açoriana. Crédito da fotografia: Luís Quinta

Maravilhas escondidas do mar português

Durante a noite, milhões de pequenas criaturas deslocam-se dos fundos abissais do oceano para a superfície, numa migração que se repete diariamente. As criaturas que compõem o plâncton podem ser belas, encantadoras ou bizarras. Conheça-as através da lente e dos textos do fotojornalista e realizador de filmes sobre história natural multipremiado, Luís Quinta.
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A maior migração no planeta Terra ocorre todos as noites nos oceanos. Milhões de pequenas criaturas deslocam-se dos fundos abissais para perto da superfície.

A coberto do escuro uma biomassa de milhares de toneladas sobe a coluna de água, dezenas ou centenas de metros para se alimentar de fitoplâncton.

O plâncton são seres vivos que embora tenham capacidade de locomoção não conseguem contrariar as correntes marinhas. No infindável universo do plâncton estes organismos estão divididos em dois grandes grupos, o fitoplâncton com capacidade de fotossíntese e o zooplancton sem essa capacidade.

Podem ser belas, encantadoras ou bizarras as criaturas que constituem o plâncton. Podem ser invisíveis a olho nu ou atingir vários metros de comprimento.

Neste artigo, com fotogaleria, revelam-se algumas das criaturas de zooplâncton que navegam em águas nacionais.

Caravela portuguesa em águas nacionais. Crédito da fotografia: Luís Quinta
Caravela-portuguesa, composta por 4 criaturas distintas que formam uma colónia.

Por toda a costa portuguesa circulam várias espécies de medusas, ou animais gelatinosos mais complexos, como por exemplo as caravelas portuguesas.

O nome lusitano e o aspeto gráfico exuberante escondem um animal elaborado e tóxico para quem lhe tocar.

A ciência descreve esta criatura como um conjunto de quatro indivíduos destintos, com funções diferentes, que vive agregado numa colónia. Uma das partes, o saco de gás, permite a todo o conjunto flutuar à superfície. A função de captura de alimento é realizada por outro indivíduo, bem como os órgãos reprodutores num outro pólipo e, por fim, o setor digestivo, que é descrito como outro organismo.

A caravela portuguesa é uma das presas prediletas das tartarugas.

Medusa-Lua quase a tocar a superfície nas águas dos Açores. Crédito: Luís Quinta.
Medusa-lua quase a tocar a superfície nas águas dos Açores.
Água-viva nas águas da costa açoriana. Crédito da fotografia: Luís Quinta
Uma água-viva nas águas da costa açoriana.

Por vezes, ao largo do cabo Espichel, quando estou embarcado, parado à deriva, vejo micro animais florescentes a vaguear uns centímetros abaixo da superfície. 

São crustáceos, copépodes de várias espécies, que em função da inclinação da luz nos seus corpos lustrosos, refletem cores variadas do arco-íris.

Umas espécies, com dois, ou três milímetros, passam toda a sua vida à superfície do mar, sem ultrapassar uns milímetros de profundidade. Outras apanham boleia de animais gelatinosos e fazem largas milhas instalados, confortavelmente, no seu hospedeiro. 

Estão descritas mais de 12 mil espécies de copépodes. 

Há cerca de 12 000 espécies conhecidas de copépodes. Crédito: Luís Quinta.
Um copépode com ovos. O seu tamanho é de 2 milímetros.
Imagem de um ctenóforo no oceano. Crédito: Luís Qunta
Um ctenóforo suspenso no oceano.

Aos primeiros vislumbres de luz de um novo amanhecer, esta multidão de seres minúsculos volta a mergulhar para o fundo marinho.

Nestas viagens verticais, encontram múltiplos predadores. Eles próprios, por vezes, são tão vorazes que se caçam entre si.

Crustáceos, larvas de peixe, ovos de inúmeras espécies, animais gelatinosos, podem fazer parte desta rica sopa que serve de base alimentar a grandes cardumes de peixe, como sardinhas, cavalas, carapaus, agulhinhas, entre muitos outros.

Este caldo é de tal forma nutritivo que grandes tubarões, como o tubarão-baleia ou o tubarão-frade, se deliciam com este menu.

Muitas das grandes baleias alimentam-se preferencialmente de plâncton, podendo também, em situações de abundância, comer pequenos peixes de cardume.

Se o grupo de animais gelatinosos, medusas, ctenofros ou salpas é muito diverso, o mundo dos crustáceos é quase inesgotável. Os copépodes, os camarões, os caranguejos, são alguns dos bichos mais representados.

Krill, pequenos crustáceos, semelhantes ao camarão, que servem de alimento servindo de alimento a peixes e mamíferos marinhos. Crédito: Luís Quinta
Krill, pequenos crustáceos, semelhantes ao camarão, que alimentam peixes e mamíferos marinhos.

Inúmeras espécies de crustáceos antes de terem o aspeto que conhecemos passam por fases larvares muito distintas da forma final adulta.

Por exemplo, muitos caranguejos depois de eclodirem dos ovos, têm a fase larvar de zoé que, tipicamente, apresenta uns espinhos de várias formas. Alguns dias depois, dependendo das espécies, passam a megalopas, outra fase larvar já com um aspeto mais próximo da versão final, mas ainda suspensas na coluna de água.

Um caragueijo no último estadio da fase larvar, conhecido como megalopa. Crédito: Luís Quinta
Um caranguejo no último estadio da fase larvar, conhecido como megalopa.
Imagem de um carangueijo na fase larvar (zoe). Crédito: Luís Quinta.
Imagem de caranguejo na fase larvar zoé.
Imagem de outro carangueijo na fase larvar. Crédito Luís Quinta.
Outra Imagem de caranguejo na fase larvar zoé.

Muitas destas criaturas passam todo o seu ciclo de vida em mar aberto, suspensas na água. Muitas outras apenas fazem parte do plâncton durante uma fase da sua vida, quando ainda são ovos ou numa fase larvar do seu percurso.

Neste mar de organismos marinhos, há histórias de vida notáveis, complexas, muito elaboradas e em muitos casos pouco conhecidas do grande público.

As Velella velella (veleiros) que podem agrupar-se em largos milhões de indivíduos ao largo da costa portuguesa servem de alimento ao carismático peixe-lua. Assim como podem servir de base e refeição aos gastrópodes pelágicos Janthina janthina.

Pequenos caracóis do mar aberto, instalam-se entre os tentáculos dos animais gelatinosos e vão-se alimentando à medida das necessidades. 

Imagem de uma velela, organismo que navega à superfície, arrastado pelas correntes marinhas. Crédito Luís Quinta.
Detalhe de uma Velella velella, que navega à superfície, arrastada pelas correntes.
Uma larva de um crustáceo. Crédito: Luís Quinta.
Larva de um crustáceo.

Nos abismos escuros e frios do mar português, as fêmeas de um crustáceo de aspeto bizarro, Phronima sp. agarram-se a animais gelatinosos, com mais frequência às salpas, e preparam-se para criar a sua prole. 

Depois de se introduzirem no interior da salpa, onde se alimentam nos próximos tempos, as phronimas, desenvolvem os ovos presos no abdómen.

Com tenazes robustas e desproporcionais ao seu corpo, vão moldando o «apartamento» para acolher os seus recém-nascidos.

Após a eclosão, as dezenas de mini crustáceos alimentam-se do hospedeiro que os transporta, supervisionados pela progenitora, que não os abandona em toda a sua fase juvenil.

Imagem de uma Phronima no interior de uma salpa. Crédito: Luís Quinta.
Phronima no interior de uma salpa. Os ovos da phronima vão eclodir e alimentar-se da hospedeira.

Todo o mundo do zooplâncton está organizado por tamanhos e zonas de distribuição na coluna de água.

Acima de 20 cm todos os seres vivos pertencem ao megaplâncton. Entre os 2 cm e os 20 cm ao macroplâncton e ao mesoplâncton aqueles entre os 0,2 mm e os 2 cm. Ainda existem outras quatro escalas, mas são impossíveis de ver a olho nu.

 

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