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Tem uma pessoa direito a recusar cuidados médicos, para si ou para um terceiro dependente, por motivos religiosos, culturais ou morais?

Depende das circunstâncias e de ser o próprio ou não.

No caso do próprio, sim, inexistindo uma situação de extrema urgência e de risco para a vida. A recusa pode ocorrer inicialmente, havendo oposição à proposta terapêutica apresentada, ou traduzir-se na suspensão ou cessação de uma intervenção já em curso.

A recusa de tratamento médico fundamenta-se na liberdade de consciência, de religião e de culto, bem como na salvaguarda da integridade física e moral, todos considerados direitos fundamentais pela Constituição da República Portuguesa. Também o Código Deontológico da Ordem dos Médicos impõe respeito pelas opções religiosas, filosóficas ou ideológicas dos doentes, garantindo que recebem o tratamento e conforto moral adequados à sua convicção.

Para a recusa de tratamento ser legítima, o profissional de saúde encontra-se obrigado a prestar ao doente toda a informação necessária sobre a situação clínica, a intervenção proposta e as alternativas terapêuticas disponíveis, bem como os riscos e consequências da adesão ou recusa da terapêutica proposta. Nestas situações, o dever de informar que impende sobre os profissionais de saúde — em especial os médicos — é especialmente reforçado.

A recusa deve ser expressa, clara e inequívoca, devendo os profissionais de saúde proceder a um registo completo dela no processo clínico do doente. Pode exigir-se uma declaração escrita ou testemunhada, e a recusa de tratamento — tal como sucede no consentimento para determinados tratamentos — é válida desde que o doente tenha capacidade jurídica.

Em situações de extrema urgência com risco de vida em que o paciente não possa manifestar o seu consentimento, é este dispensado, pelo que prevalece o dever de agir do médico decorrente do seu código de ética.

Os doentes menores de idade sem o discernimento necessário e os doentes em situação de acompanhamento, nos casos em que a sentença de acompanhamento assim o declare, não podem considerar-se como tendo competência para assumir decisões sobre cuidados de saúde, pelo que se justificam os actos terapêuticos para os quais não foi obtido consentimento e que se destinam a salvar a sua vida ou prevenir sequelas, designadamente a administração de sangue ou dos seus derivados. Nestas situações, os pareceres das comissões de ética na área da saúde determinam que deve requerer-se a autorização dos representantes legais, mas que prevalece o dever de actuar dos médicos que devem administrar o sangue ou os seus derivados.Considera-se que aquela autorização do representante legal do menor ou acompanhado não corresponde ao exercício de uma autonomia pessoal e indelegável. Em situações que não sejam de extrema urgência ou de risco de vida, os mesmos pareceres recomendam, no caso de menores ou acompanhado , o recurso aos tribunais para que decretem as medidas consideradas necessárias, designadamente concedendo a autorização recusada pelos pais ou representantes do menor ou acompanhado.  

 

O conteúdo desta página tem um fim meramente informativo. A Fundação Francisco Manuel dos Santos não presta apoio jurídico especializado. Para esse efeito deverá consultar profissionais na área jurídica.

 

 

Legislação e Jurisprudência

Constituição da República Portuguesa, artigos 25.º, n.º 1, e 41.º, n.º 1

Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina, artigos 5.º–7.º e 9.º

Código Civil, artigos 138.º e seguintes; 1918.º; 1935.º

Decreto-Lei n.º 48357, de 27 de Abril de 1968

Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de Outubro, alterado pela Lei n.º 85/2019, de 3 de Setembro 

Código Deontológico da Ordem dos Médicos, artigos 40.º; 45.º–48.º; 50.º–53.º; 59.º

Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto