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Imagem de vários postais turísticos de paisagens, ruas e monumentos nacionais promovendo o turismo em Portugal. Crédito Canva

Turismo: é importante encontrar um equilíbrio

As dormidas de turistas cresceram em 243 dos 308 municípios, entre 2019 e 2024. Mas, apesar das melhorias, o turismo em Portugal continua concentrado em três grandes regiões, quando podia ser uma alavanca para uma maior coesão territorial, escreve a economista Vera Gouveia Barros, autora do livro «Turismo em Portugal».
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Há precisamente 10 anos, terminava de escrever o ensaio Turismo em Portugal. Estávamos, então, em 2015, a sair de uma crise grave, em que o turismo tinha conseguido sobreviver com bons indicadores, o que parecia levar a que se olhasse para ele como uma panaceia. Julguei, por isso, importante reflectir sobre quais os factores do sucesso do destino Portugal e sobre a sua sustentabilidade, identificar as forças e fraquezas do sector e reconhecer as ameaças e as oportunidades que se lhe apresentavam.

Então, como agora, considerava que o turismo goza em Portugal de uma vantagem comparativa. E continuo a encontrar-lhe um grande potencial para promover a coesão territorial. Uma das “forças” que identifiquei foi a diversidade geográfica do país: temos planícies, montanhas e praias; temos cidades cheias de História e ilhas; temos florestas e vinhedos. E tudo isto condensado em 92 mil quilómetros quadrados.

Mas, em 2015, quase três quartos das dormidas verificavam-se em Lisboa, Algarve e Madeira (80%, se nos cingirmos às dos hóspedes estrangeiros), as três regiões que, nos primórdios do turismo em Portugal, se constituíram como os principais pólos de atracção. Uma década volvida e a região Norte ultrapassou a Madeira neste indicador. Em termos de hóspedes, já em 2015 o Norte substituía a Madeira no pódio e assim se manteve, mas ganhando quota. De um modo geral, olhemos nós para dormidas ou para hóspedes, concluímos que continuamos a ter uma grande concentração do turismo em três regiões, apesar encontrarmos aqui e acolá ligeiras melhorias.

Continuamos a ter uma grande concentração do turismo em três regiões, apesar encontrarmos aqui e acolá ligeiras melhorias.

Mas podemos agora fazer uma análise geograficamente bem mais fina que aquela que era possível em 2015, porque passámos a dispor de dados por município. E foi com base neles que a Pordata construiu uma série de retratos, onde ficamos a saber que, entre 2019 e 2024, as dormidas cresceram em 243 dos 308 municípios, sendo Gondomar aquele que apresentou a maior taxa de crescimento. No entanto, não valorizemos excessivamente este último facto, porque taxas de crescimento muito elevadas são bem mais fáceis de atingir quando se parte de patamares muito baixos, como é o caso de Gondomar.

Sem surpresa, no Norte, o Porto tem uma posição de absoluto destaque, com 45% das dormidas na região; o mesmo sucede com Ponta Delgada, relativamente aos Açores, e com o Funchal, para a Madeira (onde acontecem, respectivamente, 50% e 66% das dormidas). O peso de Lisboa na Área Metropolitana é ainda mais impressionante: 75% (que passa para 81%, se considerarmos apenas os turistas estrangeiros). Já a hegemonia de Albufeira no Algarve é menos notória (37%, seguindo-se Loulé, que tem 14%). Alentejo e Centro são regiões mais equilibradas, onde nenhum concelho tem uma “quota de mercado” superior a 20%, mas talvez seja inesperado, num primeiro pensamento, que Ourém ocupe o primeiro lugar do Centro; depois, lembramo-nos de Fátima, do turismo religioso, e o resultado até parece intuitivo.

Os concelhos não são todos iguais. E assim é possível que as 16 mil dormidas por cada 100 habitantes de Albufeira sejam mais sustentáveis que as 448 da Ribeira Grande.

Em 2015, escrevia «[s]e a oferta se diversificou em termos de produtos, a procura continua muito concentrada geograficamente. Este facto torna o turismo menos capaz de contribuir para a coesão territorial e pode até acentuar assimetrias.» Com os dados que agora temos, mais desagregados, podemos concluir que, não só existe uma substancial disparidade entre os sete destinos regionais (inter-regiões), como também a realidade intra-regiões é bastante desigual. E, portanto, fortalece-se a convicção de que é preciso pôr estes concelhos vizinhos a conversar e a trabalhar em conjunto.

Naturalmente, esta análise seria simplista sem a introdução das dimensões territorial e populacional, porque é expectável que concelhos maiores tenham, ceteris paribus, capacidade de carga maior.

Mas quando analisamos a intensidade turística (dormidas por 100 habitantes) ou a densidade turística (dormidas por km2) ao nível municipal, constatamos que não é bem assim e que os valores variam muito. Mas, obviamente, é preciso prestar atenção ao “ceteris paribus”. Os concelhos não são todos iguais: há-os urbanos e rurais, com e sem reservas naturais, com populações que têm distintos graus de receptividade a forasteiros. E assim é possível que as 16 mil dormidas por cada 100 habitantes de Albufeira sejam mais sustentáveis que as 448 da Ribeira Grande.

Essa é uma diferença que estes 10 anos fazem. Se, em 2015, havia uma quase histeria com o sector, escrevendo em 2025 tenho de dar conta de discursos de rejeição do turismo, às vezes, também com algum exagero de sentido oposto, atribuindo aos turistas a responsabilidade por todos os males do mundo.

Ora, nós não queremos perder essa nossa marca distintiva e factor de competitividade que já João de Barros identificava, a nossa hospitalidade. Mas, sobretudo, não nos queremos esquecer que o turismo não é um fim em si mesmo, é um meio para a prosperidade, a realização e o bem-estar das populações. Ao fim do dia, trata-se de encontrar o equilíbrio, esse conceito tão caro aos economistas.

* O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor

Portuguese, Portugal