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Imagem de uma mão de criança na mão de um adulto.

Decidir ter filhos também depende das políticas públicas

A baixa fecundidade e o envelhecimento são tendências demográficas que vieram para ficar. As políticas públicas são fundamentais para responder aos desafios desta nova realidade, num país envelhecido e que deverá perder 23% da sua população ativa até 2060. Mas «não há soluções, nem resultados imediatos para problemas complexos». A opinião da especialista em população Lara Patrício Tavares, no Dia Mundial da População.
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Numa altura em que o que o tempo parece ter acelerado, vale a pena refletir sobre o fim último da ciência. A ciência e os avanços tecnológicos devem contribuir para aumentar o bem-estar das populações. O mesmo se poderá dizer das políticas públicas.

Assim, podemos olhar para o Dia Mundial da População como um momento para celebrar todos os progressos que já alcançámos, mas também refletir sobre o futuro. É importante não abdicar de uma perspetiva de longo prazo sobretudo quando se fala de dinâmicas da população. E devemos ir além da retórica alarmista da extinção da população – talvez valha a pena lembrar que a ‘bomba da população’ dos anos 60 e 70 (do séc. XX) não explodiu.

Neste mundo em mudança, as migrações ganharam uma relevância acrescida e vieram acelerar a Demografia, como diz Francesco Billari – sim, o fenómeno da aceleração também se observa na Demografia.

Ainda assim, a Demografia é, na sua génese, lenta. Porquê? É fácil de explicar. O seu tempo é o nosso tempo, o tempo humano, não o da tecnologia. Não se pode apressar o seu crescimento. Uma geração renova-se a cada 25 ou mesmo 30 anos – a duração do ciclo de reprodução da vida humana.  

A baixa fecundidade veio para ficar. Em Portugal, como na maior parte do mundo.

É claro que o volume da população de um país pode sofrer alterações mais repentinas por via da imigração, com a entrada de indivíduos já adultos.

É isso que explica que a população residente em Portugal tenha vindo a aumentar nos últimos anos, pese embora o número de nascimentos ter descido novamente em 2024 – depois da recuperação pós-Covid - e esteja em valores abaixo dos observados em 2015.

A tendência de longo prazo da fecundidade é clara e mostra que a baixa fecundidade veio para ficar. Aqui, como na maior parte do mundo. Globalmente, duas em três pessoas vivem num país com uma fecundidade abaixo do nível de reposição de gerações.

Até 2060, Portugal pode perder cerca de 23% da população ativa entre os 20 e os 64 anos.

Esta nova realidade de baixa fecundidade e natalidade coloca grandes desafios, desde logo à economia, pois o envelhecimento demográfico reduz os recursos humanos do país.  Segundo a OCDE, Portugal pode perder cerca de 23% da população ativa entre os 20 e os 64 anos (Employment Outlook 2025) até 2060.

Contudo, por um lado, tem de se ter em conta que a esperança de vida tem vindo a aumentar (um dos nossos maiores progressos) e que, se se observarem aumentos ainda mais significativos da esperança de vida saudável, é natural que as pessoas trabalhem mais anos. Por outro lado, não se podem esquecer os avanços tecnológicos e como estes complementam os recursos humanos.

Ou seja, as gerações futuras apesar de mais pequenas podem ser tão ou mais produtivas do que as atuais. Ou seja, as necessidades de mão-obra podem vir a ser menores.

Tal como a baixa fecundidade, o envelhecimento também veio para ficar durante bastante mais tempo. O índice de envelhecimento parece mostrar que entre 2021 e 2024 o ritmo de envelhecimento abrandou.

Porém, é preciso ter conta os efeitos da pandemia Covid-19. Em 2021, e ao contrário do que tinha vindo a acontecer de forma praticamente contínua até então, a esperança de vida aos 65 anos desce, de 19,9 para 19,6 anos, só recuperando em 2024 quando atinge o mais alto valor de sempre, 20 anos.

O excesso de mortalidade nos grupos etários mais elevados entre 2021 e 2023 devido à crise pandémica quebrou o ritmo de crescimento do índice de envelhecimento. Entretanto, a tendência de subida foi retomada.

Os períodos de transição e ajustamento são sempre difíceis. Mas isso não nos deve assustar e fazer optar por soluções que não o são de facto, como sejam as políticas pro-natalistas.

Múltiplos estudos empíricos mostram que essas políticas são ineficazes. Além disso, não visam verdadeiramente o bem-estar das pessoas. As politicas pro-natalistas assumem que a fecundidade é inteiramente resultado de uma escolha.

Porém, como refere o State of World Population 2025 «o conjunto de condições que permitem às pessoas exercer os seus direitos reprodutivos e garantir uma verdadeira escolha, incluindo a igualdade de género, a estabilidade económica, uma saúde decente e a confiança no futuro (...) estão ainda fora do alcance de demasiadas pessoas. Como tal, todos nós, incluindo os decisores políticos, devemos perguntar o que as pessoas querem e precisam» (UNFPA 2025).

E depois, é preciso tempo. Não há soluções nem resultados imediatos para problemas complexos.

 

Conheça o Press da Pordata dedicado ao Dia da População, aqui.

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