
Quem são os abstencionistas em Portugal?
A participação dos cidadãos nas eleições é uma componente essencial do funcionamento das democracias representativas, constituindo a ferramenta mais forte e eficaz que estes têm à sua disposição para influenciar o processo de definição de políticas públicas e, globalmente, o governo da coisa pública.
Em Portugal, tem-se observado ao longo das últimas décadas uma erosão da participação eleitoral.
Neste contexto, este estudo pretendeu analisar o fenómeno de forma ampla e aprofundada, olhando para diferentes tipos de eleições, discutindo a precisão dos números oficiais, identificando os principais fatores que contribuem para o não exercício do direito de voto e recolhendo narrativas e perceções tanto de eleitores como de representantes políticos eleitos sobre os impactos da abstenção e as reformas para a combater.
Em baixo, destacamos alguns dos principais resultados desta investigação.
Em primeiro lugar, o nosso estudo aponta para que haja em Portugal um fenómeno de abstenção técnica de magnitude importante, que não resulta dos chamados «eleitores-fantasma» (já falecidos) mas da existência de uma proporção significativa de recenseados nalgumas zonas do território nacional que residem no estrangeiro, mas optaram por não alterar a sua morada oficial.
Retirando estes eleitores da equação, nas legislativas de 2025 terão votado em território nacional 73% dos recenseados que efetivamente vivem em Portugal, valor que contrasta com o número oficial da participação (64%).
Em segundo lugar, se quiséssemos fazer um retrato-robô do abstencionista português típico, descrevê-lo-íamos como alguém jovem, com baixos níveis de escolaridade, pertencente a uma classe social mais baixa, pouco religioso, arrendatário da casa em que vive e residente a uma distância considerável do local em que deve depositar o seu voto.
Esta pessoa dir-nos-ia que não tem muito interesse na política, que não existe nenhum partido com que se identifica e que não se sente culpada quando se abstém, porque não entende o voto como um dever.
Este último aspeto merece ser destacado: o sentimento de dever cívico, que é mais forte entre cidadãos mais velhos, mais instruídos, com práticas religiosas mais frequentes e pertencentes a classes sociais mais altas, é, neste estudo, um dos fatores mais determinantes da participação eleitoral, sendo até capaz de reduzir os efeitos desmobilizadores da distância ao local de voto.
Por fim, os participantes no nosso estudo destacaram que os principais impactos da abstenção são a desresponsabilização dos políticos, o facto de as políticas públicas poderem não ser desenhadas com base no interesse de todos, e problemas em termos de legitimidade dos eleitos.
Baseadas nos resultados desta investigação, as recomendações formuladas focam-se em três áreas principais: reforçar o dever cívico, reduzir barreiras logísticas ao voto e introduzir mudanças institucionais moderadas que incentivem a participação.