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Imagem de um mão com um lápis a traçar o caminho para sair do labirinto.

As políticas públicas em Portugal mudam assim tanto?

Um estudo pioneiro no país lança um novo olhar sobre a persistente perceção de falta de continuidade nas políticas públicas. Uma ideia apontada como causa de ineficiências e desperdício de recursos ou desconfiança nas instituições. Neste artigo, Patrícia Silva, coautora desta investigação, escreve-nos sobre as principais conclusões.
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Em Portugal, a perceção de descontinuidade nas políticas públicas está profundamente enraizada. Essa narrativa, longe de ser apenas uma construção da comunicação social e da opinião pública, é também uma preocupação ressaltada por detentores de cargos políticos.

Porque nos devem preocupar estas perceções dos cidadãos?

Frequentemente, essa descontinuidade é entendida como uma importante fonte de ineficiência e desperdício de recursos, que, em última análise, prejudica os investimentos e a confiança dos cidadãos na esfera política.

Mais ainda: é amplamente consensual a importância destas perceções, na medida em que podem condicionar as ações de cidadãos, afetar o apoio e envolvimento democrático, e minar a confiança no governo e nas instituições políticas.

No entanto, até hoje, esta perspetiva tem-se baseado em observações pessoais e não sistemáticas, carecendo de um exame empírico aprofundado que permita identificar e compreender os padrões de continuidade e de mudança nas políticas públicas.

Este estudo, pioneiro em Portugal, analisa a evolução dos dados orçamentais, das reorganizações da administração e das nomeações ao longo de 44 anos de governação (1976–2020), não só mapeando os padrões de continuidade e mudança, mas analisando também os fatores que os explicam.

As mudanças mais marcantes surgem em contextos de crises económicas e em cenários de alternância partidária completa.

O que este estudo permite concluir sobre as (des)continuidades das políticas públicas em Portugal? As quatro décadas de democracia analisadas revelam longos períodos de estabilidade e mudanças incrementais, com os momentos de mudança mais intensa associados a crises económicas, a momentos-chave da integração europeia ou a alterações governamentais.

Embora se observe uma tendência para a continuidade estrutural, especialmente desde a primeira década do século XXI, as mudanças mais marcantes surgem em contextos de crises económicas e em cenários de alternância partidária completa.

Além do impacto das variáveis políticas tradicionais – como a alternância no governo, o grau de conflito, a ideologia e os choques exógenos – como preditores das alterações nas políticas públicas, o estudo destaca a importância crucial da aprendizagem institucional.

No início da democracia, os governos privilegiaram as alterações aos orçamentos, a partir de 2010 destaca-se a preferência pelo controlo de políticas públicas através das mudanças de dirigentes da administração.

Esta aprendizagem, ao longo do tempo, tem moldado significativamente a maneira como os decisores utilizam essas ferramentas. Se, nos primeiros anos de vida democrática, os governos privilegiaram as alterações aos orçamentos, a partir da primeira década no novo milénio, destaca-se a preferência dos governos pelo controlo de políticas públicas através das mudanças de dirigentes da administração.

E em momentos-chave, durante reformas (2005; 2012), operaram-se grandes reorganizações da máquina pública.

Há, assim, sinais de adaptação e aprendizagem institucional no uso destas ferramentas.

Num contexto de crescente complexidade e desafios globais, os decisores políticos enfrentam a difícil tarefa de equilibrar a necessidade de mudanças ágeis com a preservação de princípios fundamentais de governança democrática e eficácia administrativa, capazes de mitigar os desafios associados à instabilidade.

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