Barack Obama: «Se não fossem pessoas como Ruby Bridges, eu não teria sido Presidente»
No Verão de 2011, Ruby Bridges (convidada especial do Encontro da Fundação de 30 de Setembro de 2017) visitou a Casa Branca para ver o local onde havia sido colocada uma pintura representativa das suas conquistas pessoais e históricas. Traduzimos o que Ruby e Barack Obama disseram na ocasião.
«Se não fossem pessoas como Ruby Bridges, eu não seria hoje Presidente e não estaríamos aqui a olhar para esta pintura.»
Estas palavras de Barack Obama «significaram muito» para Ruby Bridges, nas palavras da própria. O quadro representa a caminhada de Ruby Bridges para a escola, uma escola de Nova Orleães (nos Estados Unidos) onde, no início da década de 1960, Ruby tornou-se a primeira aluna afro-americana.
Nas palavras da própria, audíveis no vídeo acima (pertencente à Casa Branca):
«A rapariga de 6 anos representada naquele quadro [de Norman Rockwell] não sabia absolutamente nada sobre racismo. Eu estava simplesmente a ir para a escola, naquele dia. Mas a lição que aprendi ao longo daquele ano, no edifício vazio da escola onde tive aulas, foi que nenhum de nós, quando nasce, sabe seja o que for sobre não gostarmos uns dos outros. Isso é algo que nos é transmitido. Por isso, sempre que vejo o quadro lembro-me de que era inocente, não compreendia o que estava a acontecer naquele dia. Mas aprendi uma lição muito importante: a de que nunca devemos olhar para alguém e julgá-lo pela cor da sua pele. Essa foi a lição que aprendi no meu primeiro ano de escola.»
Num longo artigo sobre Ruby Bridges e o quadro de Norman Rockwell, 'The problem we all live with', António Araújo (director de publicações da FFMS) escreveu:
«Não havia o direito de a insultarem quando, aos seis anos de idade, [Ruby] se dirigiu a uma escola em Nova Orleães para ser a primeira aluna negra a ter aulas num local que até então só era frequentado por brancos.
Não havia o direito de todos os professores dessa escola se recusarem dar-lhe aulas. Durante um ano, foi a única aluna de uma turma, com uma professora especialmente enviada de Boston. A voluntária, vinda do Massachusetts, ensinou-a «como se estivesse a dar aulas para uma turma inteira». A menina estranhou ao princípio, pois nunca tivera uma professora branca. Hoje recorda-a como a melhor professora que teve na vida. Professora e aluna não faltaram um dia sequer.
E não havia o direito de, todas as manhãs, uma mulher a ameaçar na rua, dizendo-lhe que a iria envenenar («I’m going to poison you. I’ll find a way!»), a ponto de os agentes federais destacados para a proteger terem determinado que a menina só poderia comer o que trouxesse de casa. Não havia o direito de uma outra mulher, mãe de filhos, a assustar à porta da escola, mostrando-lhe uma boneca vestida de negro dentro de um caixão. Ainda hoje ela recorda que isso a atemorizou mais, muito mais, do que os insultos que ouvia enquanto caminhava. Não havia o direito de o seu pai ter perdido o emprego apenas porque a filha, na Primavera de 1960, ter sido dos poucos alunos negros que passaram nos testes para serem os primeiros a estudarem em escolas integradas. Os testes eram propositadamente difíceis: quantos mais reprovassem no exame de admissão mais forte seria o argumento para manter um sistema que separava negros e brancos. Dos 135 alunos que concorreram, só seis foram apurados. Desses, dois decidiram ficar na escola de origem e três foram transferidos para McDonough. A menina ficou só, a única criança negra inscrita na William Frantz Elementary School.
Não havia o direito de lá longe, no Mississípi onde a menina nascera, os seus avós serem expulsos das terras onde trabalhavam há 25 anos como rendeiros, no ancestral regime de sharecropping. Expulsos apenas porque a neta frequentava uma escola que era reservada a meninos de pele branca. Eram também brancos os donos de uma mercearia a que os seus pais habitualmente iam às compras; desde o dia em que a menina entrou na escola, disseram à sua família para não voltar a aparecer na loja. Não havia o direito.
Mas havia o Direito, e outros direitos. Um tribunal ordenara que as crianças negras tinham esse direito – o direito de frequentarem as mesmas escolas que as outras crianças, que delas se distinguiam apenas pela cor da pele. 1 de Novembro de 1960. A ordem era para cumprir, mesmo que os pais das crianças brancas não tenham aceitado a decisão dos tribunais, tirando os filhos da escola no dia em que a menina negra lá entrou. No primeiro dia nem houve aulas, com ela refugiada no gabinete do director. As autoridades não vacilaram. O Presidente Eisenhower enviou agentes federais para a proteger.»
Continue a ler o artigo de António Araújo.
O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor.