Direitos e Deveres
O exercício dos direitos, liberdades e garantias não pode ser suspenso pelos órgãos de soberania, excepto em caso de estado de sítio ou de emergência, declarados pelo Presidente da República. Essa suspensão deve ser feita por meio de lei em que constem a respectiva extensão, duração e meios utilizados; deve ser estritamente necessária ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional; e jamais poderá afectar os direitos à vida, à integridade e à identidade pessoais, à capacidade civil e à cidadania, bem como a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e religião.
Os direitos fundamentais que podem ser restringidos em situações de emergência são os de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva; a capacidade eleitoral passiva (ou seja, o direito a candidatar-se e ser eleito para cargos públicos) dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes e em serviço efectivo, bem como dos agentes dos serviços e forças de segurança.
Os direitos fundamentais não podem ser extintos, nem mesmo em eventuais revisões da Constituição.
CONST
O conteúdo desta página tem um fim meramente informativo. A Fundação Francisco Manuel dos Santos não presta apoio jurídico especializado. Para esse efeito deverá consultar profissionais na área jurídica.
Constituição da República Portuguesa, artigos 18.º, n.os 2 e 3; 19.º; 26.º, n.º 4; 164.º, e), f) e o); 270.º; 288.º, d)
Os direitos fundamentais devem ser garantidos por todas as instituições próprias de um Estado de direito democrático. Quanto aos cidadãos, além de se poderem manifestar, apresentar petições, queixar ao Provedor de Justiça, deverão ter acesso a todos os meios legais de defesa contra qualquer violação de um direito fundamental, nomeadamente o direito de acesso aos tribunais.
Os direitos fundamentais estão protegidos pela Constituição contra eventuais actuações de qualquer órgão de soberania ou do Estado que os possam lesar. Existe uma proibição genérica de os restringir ou suspender, seja por via legal, seja por qualquer outra via (por ex., administrativa).
Quando um direito fundamental se encontra sob ameaça ou é ofendido, o meio de defesa por excelência é o recurso aos tribunais. Podem-se invocar violações de direitos fundamentais em qualquer tipo de tribunal, embora cada um tenha a sua competência específica. No caso de direitos cuja violação seja crime — por ex., o direito à vida, o direito à integridade pessoal, o direito à intimidade da vida privada e familiar ou o direito à propriedade privada —, o cidadão deve accionar penalmente o infractor (seja este outro cidadão ou uma pessoa colectiva pública ou privada), denunciando ou queixando-se às autoridades competentes.
Fora do plano criminal, o cidadão afectado nos seus direitos fundamentais pode recorrer aos tribunais civis ou administrativos: por exemplo, mediante providências cautelares para suspender os efeitos de determinado acto da Administração, de acções para declarar um direito, para intimar ou condenar em determinadas prestações (como uma indemnização para um dano causado), para impor proibições ou regras de conduta.
Em qualquer tribunal, um cidadão pode invocar a invalidade ou inconstitucionalidade das normas jurídicas que considere lesivas de um direito fundamental, com o objectivo de suspender ou extinguir os efeitos dessas normas.
Os cidadãos têm ainda um direito de resistência que lhes dá o poder de se oporem a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias. À luz do direito de resistência, pode ainda, no limite, repelir pela força uma agressão quando não seja possível recorrer à autoridade pública, nomeadamente aos tribunais. O exercício desse direito tem de ser necessário e proporcional ao bem que visa defender.
Finalmente, se houver violação de direitos fundamentais pela Administração Pública, os cidadãos podem sempre recorrer aos órgãos de soberania ou ao Provedor de Justiça, mediante uma petição, reclamação ou queixa. Podem ainda apelar para instâncias internacionais, como o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (esgotado o recurso aos tribunais portugueses) ou o Tribunal de Justiça da União Europeia, ou reclamar para várias instituições da União Europeia.
A concretização de um direito fundamental estará muito mais limitada se esse direito não beneficiar do regime dos direitos, liberdades e garantias. Os direitos económicos, sociais ou culturais (por ex., o direito à protecção da saúde ou o direito à habitação) possuem um grau de protecção mais reduzido e estão dependentes da capacidade económica do Estado para os concretizar.
Caso o direito económico, social ou cultural em causa seja suficientemente concreto na sua previsão constitucional, pode pedir-se, em determinadas circunstâncias, que o Estado seja condenado a praticar o acto em falta.
CONST
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Constituição da República Portuguesa, artigos 12.º, n.º 1; 18.º; 20.º–22.º; 23.º, n.º 1; 277.º–283.º; 288.º, d) e e)
Código Civil
Código de Processo Civil
Código de Processo Penal
Código de Processo dos Tribunais Administrativos e Fiscais
Os estrangeiros e os cidadãos sem nacionalidade (apátridas) que se encontrem ou residam em Portugal têm os mesmos direitos dos cidadãos portugueses.
Exceptuam-se os direitos políticos, o exercício das funções públicas (salvo as que tiverem carácter predominantemente técnico) e os direitos e deveres expressamente reservados pela Constituição e pela lei aos cidadãos portugueses (por ex., ser candidato à Presidência da República).
A certas categorias de cidadãos estrangeiros podem atribuir-se, numa base de reciprocidade, direitos normalmente reservados aos cidadãos portugueses:
— aos cidadãos oriundos dos Estados de língua portuguesa e com residência permanente em Portugal, a generalidade dos direitos, salvo o acesso aos cargos de Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Primeiro-Ministro, presidentes dos tribunais superiores e o exercício de funções nas Forças Armadas e na carreira diplomática;
— aos estrangeiros residentes no território nacional, o direito de elegerem e serem eleitos para os órgãos de autarquias locais;
— aos cidadãos dos Estados-membros da União Europeia residentes em Portugal, o direito de elegerem e serem eleitos deputados ao Parlamento Europeu.
A exigência de reciprocidade significa que o Estado não poderá conferir ao cidadão estrangeiro direitos que o seu Estado não confira a um cidadão português. Assim, por ex., um cidadão brasileiro residente em Portugal só pode candidatar-se a uma autarquia local se um cidadão português no Brasil também o puder fazer nesse país.
CONST
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Constituição da República Portuguesa, artigos 12.º; n.º 1; 15.º; 122.º
Lei n.º 37/2006, de 9 de Agosto, alterada pelo Decreto-Lei n.º 41/2023 de 2 de junho
Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de junho
O estado de sítio e o estado de emergência são estados de excepção ao regime constitucional vigente, designadamente quanto à protecção dos direitos fundamentais.
O estado de sítio e o estado de emergência só podem ser declarados, no todo ou em parte do território nacional, em situações de agressão efectiva ou iminente por forças estrangeiras, grave ameaça ou perturbação da ordem constitucional democrática ou calamidade pública. Permitem suspender o exercício de certos direitos fundamentais, conferindo às autoridades públicas competência para tomarem as providências necessárias ao restabelecimento da normalidade constitucional.
A situação de calamidade pode ser declarada quando, face à ocorrência ou perigo de ocorrência de acidente grave ou de catástrofe, e à sua previsível intensidade, é necessário adoptar medidas destinadas a prevenir, reagir ou repor a normalidade das condições de vida nas áreas atingidas pelos seus efeitos. Pode ser declarada no todo ou em parte do território nacional.
Compete ao Presidente da República declarar o estado de sítio ou o estado de emergência, após audição do Governo e autorização da Assembleia da República. A declaração da situação de calamidade é da competência do Governo.
A diferença entre o estado de sítio e o estado de emergência reside na gravidade das situações que levaram à sua declaração. O estado de emergência refere-se normalmente a uma situação localizada (como uma epidemia de gripe), pelo que só pode levar à suspensão dos direitos, liberdades e garantias com relevância concreta para essa situação (no caso de uma epidemia, o direito à liberdade). Já o estado de sítio, aplicável em situações mais graves ou duradouras, pode determinar a suspensão de um conjunto mais alargado de direitos, pois terá por base a necessidade de prevenir ou suprimir actos muito graves que implicam o uso de força ou insurreição e que põem em causa a soberania, a independência, a integridade territorial ou a ordem constitucional democrática.
A declaração da situação de calamidade apenas pode suspender os direitos expressamente previstos na Lei de Bases da Protecção Civil. Pode estabelecer, entre outras medidas, (i) a mobilização civil de pessoas, por períodos de tempo determinados, (ii) a fixação, por razões de segurança dos próprios ou das operações, de limites ou condicionamentos à circulação ou permanência de pessoas, outros seres vivos ou veículos, (iii) a fixação de cercas sanitárias e de segurança, e (iv) a racionalização da utilização dos serviços públicos de transportes, comunicações e abastecimento de água e energia, bem como do consumo de bens de primeira necessidade.
Os estados de sítio ou de emergência não podem ter duração superior a 15 dias, salvo em consequência de declaração de guerra. Aquele prazo pode ser renovado, mas tem de respeitar os mesmos requisitos de proporcionalidade, fundamentação e duração demarcada no tempo da declaração original. Já a situação de calamidade não está sujeita a qualquer prazo legal, cabendo ao Governo determinar o seu tempo de duração.
Em caso algum podem ser afectados os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, à não retroactividade da lei criminal, às garantias de defesa dos arguidos e à liberdade de consciência e de religião. Não pode ainda ser alterada a normalidade constitucional, nomeadamente a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgãos de soberania (Presidente, Governo, Assembleia da República, tribunais) e dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Também não podem ser afectados os direitos e as imunidades dos titulares desses órgãos.
CONST
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Constituição da República Portuguesa, artigos 19.º; 134.º, d); 138.º; 164.º, e)
Lei n.º 44/86, de 30 de Setembro, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2012, de 11 de Maio
Os direitos fundamentais podem e devem ser exercidos com a maior eficácia possível. Claro que a sua concretização depende das condições que o Estado a cada momento providencia ao cidadão lesado nos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Depende também do nível de respeito que os direitos fundamentais merecem dos demais cidadãos e da sociedade em geral. A vida social, cultural e política pode incentivar, em maior ou menor grau, o exercício dos direitos e dos deveres de cidadania.
No que concerne aos direitos económicos, sociais e culturais, o nível de protecção depende em grande medida da concretização legislativa dos preceitos constitucionais, obviamente relacionada com o nível de desenvolvimento do país e da sua governação, salvo no que respeita a um núcleo essencial de direitos que representam um padrão mínimo de existência.
Quanto aos direitos, liberdades e garantias (que são aplicáveis directamente, sem necessidade de leis que os concretizem), o cidadão tem uma variedade de meios ao seu dispor. Desde logo, se estiver em causa a Administração Pública, os cidadãos podem defender os seus direitos mediante reclamações e recursos administrativos (nomeadamente o recurso hierárquico). A outro nível, o acesso aos tribunais é ele próprio um direito fundamental e representa um dos princípios fundamentais do Estado de direito.
Os tribunais podem ser usados para assegurar direitos e interesses legalmente protegidos, seja perante outros cidadãos (indivíduos ou pessoas colectivas) seja perante actos do próprio Estado nas suas várias facetas (legislador, juiz ou administrador). Deve acontecer em termos equitativos, pois todos têm direito a que o processo seja objecto de decisão por um tribunal independente e imparcial, em prazo razoável, e ainda que a sentença seja executada (feita cumprir) através de meios judiciais ou por outras autoridades públicas.
O estatuto de cidadão europeu permite, além do recurso ao Tribunal de Justiça da União Europeia, a protecção diplomática e consular de qualquer outro país da União Europeia, caso não seja viável a nacional, e ainda a petição ao provedor de Justiça Europeu e a comunicação e resposta com as várias instituições europeias, mediante certas condições, em qualquer das línguas oficiais.
Os cidadãos podem ainda recorrer individualmente, através de petição, para a Comissão Europeia dos Direitos do Homem. Esta petição, por sua vez, pode conduzir (por iniciativa da Comissão ou de outro Estado) a um processo perante o Tribunal Europeu, que eventualmente culminará numa decisão condenatória do Estado. Em alternativa, existe o direito de exposição e queixa ao Conselho de Direitos do Homem (Nações Unidas), invocando a lesão de qualquer dos direitos reconhecidos e garantidos no Pacto.
Excepcionalmente, a defesa dos direitos fundamentais pode fazer-se recorrendo ao direito à resistência, que permite resistir a qualquer agressão quando não seja possível recorrer à autoridade pública. Existe ainda direito de petição aos diversos órgãos de soberania e ao provedor de Justiça e também direito de audição e participação dos cidadãos nos procedimentos administrativos. Do mesmo modo, atribui-se a todos os cidadãos a faculdade de determinar e controlar a utilização dos seus dados pessoais e de aceder aos arquivos e registos administrativos.
CONST
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Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 10.º
Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos
Convenção Europeia dos Direitos Humanos, artigos 6.º, n.º 1; 8.º, n.º 2; 19.º
Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigos 41.º–44.º; 46.º e 47.º
Tratado da União Europeia, artigos 6.º; 9.º; 11.º; 19.º
Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, artigos 20.º; 23.º e 24.º; 227.º e 228.º; 256.º; 263.º, parágrafo 4.º; 265.º, parágrafo 3.º
Constituição da República Portuguesa, artigos 20.º e 21.º; 23.º; 35.º; 52.º; 202.º; n.º 2; 267.º, n.º 4; 268.º, n.os 1, 2 e 4
Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, alterada pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março
Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto