O «super-Camões» e outras ideias que intelectuais tiveram sobre Portugal
No livro 'Portugal, um Perfil Histórico', Pedro Calafate expõe o essencial da história das ideias que foram exprimidas por intelectuais portugueses sobre Portugal. Juntámos aqui cinco delas.
Nos séculos XV e XVI, Portugal era a «luz do mundo»
«Portugal afirma-se, pela pena de Fernão Lopes, em 1445, como ponto de confluência da história, centro de irradiação de um novo mundo que se abre e se prolongará no tempo, como mais tarde em João de Barros, o qual, na 'Crónica do Imperador Clarimundo' (1521), nos encara como "clareza do mundo", em Camões, que se refere a Portugal como "cume da cabeça da Europa", em Luís Mendes de Vasconcelos como "lugar mais privilegiado da cabeça da Europa", em Fernão de Oliveira que remete a nossa origem para uma idade de ouro em que os deuses falavam com os homens, dando-nos por essa via o prestígio dos tempos antigos, muito anteriores aos Lusitanos, e em Vieira como 'lux mundi', donde retirava a nossa condição peregrinante.» (págs. 19-20)
Segundo Vieira, Portugal estava acima até de Israel aos olhos de Deus
«Entendia, pois, António Vieira que a singularidade do reino de Portugal foi a de que "só ele, entre todos os do mundo, foi fudado e instituído por Deus", distinguindo-se aqui Portugal do reino de Israel, tambem ele instituído por Deus, pelo facto de termos nós origem na vontade deliberativa de Deus e os israelitas na sua vontade permissiva (Deus não quis, mas, em resposta à insistência do povo de Israel, 'permitiu' que tivessem rei).» (pág. 48)
Já há 400 anos se diz que a saudade é um sentimento particularmente português
«Na sua 'Origem da Língua Portuguesa' (1606), [Duarte Nunes de Leão] diz que a saudade é um "aspecto próprio dos portugueses", acrescentando que "não há língua em que da mesma maneira se possa explicar, nem ainda que por muitas palavras que se declare bem", distanciando-a do termo latino 'desiderium' (desejo) Considere-se ainda o caso de D. Francisco Manuel de Melo, quando, ao filiá-la na confluência entre o amor e a ausência, entende, nas 'Epanáforas de Vária História Portuguesa' (1660) que "somente nós sabemos o nome", porque "toca mais a portugueses que a outra nação do mundo".» (pág. 31)
Camões não apenas "cantou" a história de Portugal: também a "viveu"
«Antero de Quental, quando dissertava sobre as causas da nossa decadência, em 1870, quis ver em Camões o cantor das nossas glórias que nos empobreciam, mendigando para sustentar a velhice, triste e desalentada, tomando-o por imagem da nação. [...] Partindo da constatação de que nunca nenhum povo tivera tantos tesouros e empobrecera tanto com eles, sai em busca de uma explicação, delimitando três causas do nosso erro de via: conquistas, catolicismo e absolutismo.» (págs. 40 e 76-77)
Fernando Pessoa desejou um "super-Camões" que reerguesse o país
«O Portugal do seu tempo, tal como o viu, era um país de gente desnacionalizada [...] com elites incapazes de erguerem a "República Aristocrática" em que acreditava. Neste contexto, Portugal precisava de um "indisciplinador", de um super-Camões capaz de cultivar em nós a "desintegração mental" relativa a um estado de marasmo e de debilidade herdados daquele "Portugal-centavos [...] extrema-unção-enxovalho da Desgraça a que se referira no Ultimatum.» (pág. 88-89)
O ensaio 'Portugal, um Perfil Histórico' vai ser apresentado no dia 11 de Novembro, às 19:00, no El Corte Inglés. Confirme a sua presença para relacoespublicas@elcorteingles.pt
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O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor.