A
A
Um cidadão pratica um acto que não é punido como crime, mas que a maioria das pessoas vê como moralmente censurável. Pouco depois, há uma alteração na lei, e aquele tipo de acto passa a ser crime. O cidadão pode ser acusado?

Não.

Em regra não existe aplicação retroactiva da lei penal: um acto só é punível se a lei que vigora no momento em que é praticado o ameaçar com uma pena. O direito não se confunde com a ética nem com a moral, apesar de as condutas definidas como crime terem normalmente relevância ético-social — isto é, serem mal vistas pela sociedade, mesmo antes de as lei as definir como crime. A não retroactividade da lei é um pilar fundamental do Estado de direito. Só assim as pessoas podem orientar a sua actuação, seguras de que, respeitando a lei em vigor, não serão alvo de sanções penais.

Uma conduta considera-se praticada no momento em que a pessoa actuou, independentemente de quando se produza um eventual resultado causado por essa acção. Por exemplo, quem executasse uma prática abortiva na véspera da entrada em vigor de uma lei que passasse a punir a interrupção voluntária da gravidez, morrendo o feto já na vigência da nova lei, não seria punido.

Porém, a retroactividade da lei penal só é proibida quando a lei posterior for desfavorável a quem pratica o facto. No caso de ser mais favorável, por descriminalizar o facto ou por reduzir a pena aplicável, ela deve aplicar-se retroactivamente: se, no momento da avaliação da responsabilidade, a sociedade considera que factos daquele tipo não devem ser punidos ou devem sê-lo em menor grau, a aplicação da pena que já é vista como desnecessária seria um mal inútil e, por isso, sem sentido.

CRIM

 

O conteúdo desta página tem um fim meramente informativo. A Fundação Francisco Manuel dos Santos não presta apoio jurídico especializado. Para esse efeito deverá consultar profissionais na área jurídica.

Legislação e Jurisprudência

Constituição da República Portuguesa, artigo 29.º, n.os 1-4

Código Penal, artigos 1.º, n.os 1 e 2, e 2.º