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Gravar ou fotografar uma pessoa a cometer um crime com o objectivo de reunir provas contra ela constitui, em si mesmo, um crime? E provocar a própria prática do crime — por exemplo, fazendo-se passar por funcionário com competências em certo domínio, p...

Em princípio, trata-se de crime em ambos os casos.

A captação indevida e não autorizada de imagens ou palavras constitui um crime de gravações e fotografias ilícitas. O objectivo de reunir provas, por si mesmo, não afasta a natureza criminosa do acto. Já não será assim se a captação corresponder à defesa de um interesse protegido (por ex., a vítima fotografa o agressor ou o ladrão em flagrante, para poder reclamar os seus direitos), numa situação de legítima defesa ou de direito de necessidade.

Em Portugal, a investigação criminal cabe exclusivamente às autoridades, não se atribuindo qualquer cobertura legal ou privilégio à realização de investigações privadas. Fotografar ou filmar outra pessoa é um acto particularmente invasivo da privacidade; mesmo as autoridades só podem praticá-lo dentro das estritas condições legalmente previstas. De outro modo, a intromissão será considerada abusiva e as provas obtidas através dela serão nulas, não podendo ser usadas num processo penal senão justamente para incriminar quem as obteve. Este regime pode significar a impossibilidade de condenar, por falta de provas, pessoas que, de facto, parecem ter praticado crimes, mas é esse o preço a pagar por um ambiente livre de ingerências abusivas.

Se a pessoa provocar a prática de um crime, pode ser punida como instigadora do mesmo crime, ainda que se trate de um agente de investigação criminal à procura de provas para incriminar o provocado. Já se o agente infiltrado se limitar a cometer o crime em conjunto com os outros ou a auxiliá-los com o fim de obter prova contra eles, a lei exclui a sua responsabilidade, desde que a sua acção tenha respeitado um princípio de proporcionalidade.

A provocação constitui um método proibido de prova, pois seria paradoxal que o Estado administrasse a justiça penal incentivando o cometimento de crimes. As provas assim obtidas podem ser usadas apenas para estabelecer a responsabilidade criminal do agente provocador, que, como se referiu, não beneficiará de qualquer privilégio.

CRIM

 

O conteúdo desta página tem um fim meramente informativo. A Fundação Francisco Manuel dos Santos não presta apoio jurídico especializado. Para esse efeito deverá consultar profissionais na área jurídica.

 

Legislação e Jurisprudência

Constituição da República Portuguesa, artigos 26.º, n.os 1 e 2; 32.º, n.º 8

Código Penal, artigos 26.º e 199.º

Código de Processo Penal, artigos 126.º, n.º 2, a), e n.º 4; 171.º e seguintes

Lei n.º 101/2001, de 25 de Agosto, alterada pela Lei n.º 2/2023, de 16 de janeiro

Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, alterada pela Lei n.º 14/2024, de 19 de janeiro, artigo 6.º