Todos somos chamados a estabelecer uma nova relação com a energia
Pelo menos desde 1973, quando o racionamento de gasolina nas estações de serviço provocou longas filas e amplas angústias e os jornais publicavam diariamente fotografias de excêntricos xeques árabes, a energia entrou no quotidiano da sociedade ocidental.
Mais tarde, acalmado o mercado petrolífero e reduzida a volatilidade dos preços, imagens de grandes metrópoles americanas, europeias e asiáticas, cobertas de fumo denso provocado pela combustão em motores automóveis, caldeiras de aquecimento urbano e centrais eléctricas próximas, cidades onde as autoridades decretavam a proibição de circular por razões de saúde pública, tornaram visíveis e evidentes as consequências nefastas do uso excessivo de combustíveis fósseis.
Por outro lado, os acidentes nas centrais nucleares de Chernobil (1986) e Fukushima (2011), assim como alguns acidentes petrolíferos com a exploração (por exemplo: Piper Alpha Platform, Mar do Norte,1988 e Deepwater Horizon, Golfo do México, 2010) e o transporte (Prestige, Espanha, 2002; Sanchi, Mar da China, 2018, etc.), revelaram a escala dos riscos ambientais associados a diferentes tecnologias energéticas.
O preço da energia – em particular da energia eléctrica – é um tema recorrente, sobretudo em períodos eleitorais, quando ocupa as primeiras páginas dos jornais, invadindo igualmente publicações de cariz económico e tabloides.
Quando se fala dos grandes desafios da Humanidade, o que acontece com redobrada frequência, num mundo finito cuja população aumenta rapidamente, a energia surge como um dos tópicos incontornáveis. Por exemplo, a resolução da Organização das Nações Unidas denominada “Transformar o nosso mundo: Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável”, aprovada por unanimidade, que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2016 e dá continuidade aos “Objetivos de Desenvolvimento do Milénio”, que vigoraram entre os anos 2000 e 2015, inclui, entre os seus 17 objectivos, o seguinte: “Garantir o acesso a fontes de energia fiáveis, sustentáveis e modernas para todos”.
Recentemente, a difusão de novas tecnologias e novos produtos – por exemplo, automóveis eléctricos, centrais eólicas e painéis fotovoltaicos de uso doméstico – começou a alterar, literalmente, radicalmente, a paisagem energética.
A descarbonização da economia planetária, estipulada no Acordo de Paris, implica uma profunda transformação da nossa relação com a energia – isto é, da escolha das fontes de energia primária que se exploram, do modo como se transforma, armazena, transporta, comercializa, partilha e utiliza energia. Esta nova transição energética já arrancou, em todos os continentes, e o ritmo aumenta todos os anos. No passado, registaram-se outras importantes transições energéticas; esta é a nossa, aquela que nos cabe viver e moldar.
Contribuir activamente para a transição energética – ou mesmo adaptar-se passivamente a ela – obriga a compreender o sentido e a direcção das transformações em curso. Com as categorias e os (pre)conceitos do passado, tal não se consegue; para antecipar o futuro é indispensável utilizar novos conceitos, novas métricas e novos valores. Cidadãos, empresários, investigadores e decisores políticos, todos somos chamados a estabelecer uma nova relação com a energia.
O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor.