O poder dos alimentos
«Somos o que comemos?», reveja o debate Fronteiras XXI
Os hábitos alimentares dos portugueses estão a ter impacto no aumento de doenças como o cancro, as cardiovasculares, a depressão e até as demências. Um dos alvos da investigação é agora a flora intestinal, onde coabitam 100 mil milhões de bactérias boas e más para a saúde, que ganham poder com os nutrientes que recebem. E em laboratórios nacionais testam-se o efeito da casca da laranja no tumor colorectal, do azeite nas doenças cardiovasculares e do vinho na diabetes. Certo é que a alimentação ao longo das últimas décadas reflecte a vida social, económica e cultural do país.
Por saberem que os citrinos têm potencial anti-cancerígeno, uma equipa de investigadoras portuguesas decidiu pegar na casca de laranja e testar o seu efeito no cancro colorectal. Dentro do laboratório, e usando avançada tecnologia, extraíram compostos puros da casca do citrino e com eles trataram células humanas daquele tumor. Resultado: perceberam que a casca de laranja reduz a população de células estaminais cancerígenas, que são mais resistentes à quimioterapia.
A descoberta deu a Rosário Bronze, responsável do laboratório de Alimentação e Saúde, do Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica (IBET), e à sua equipa, mais uma prova de que os alimentos são hoje aliados no combate às doenças.
«Não há dúvida que a alimentação pode prevenir o aparecimento do cancro», diz Teresa Serra, uma das investigadoras que testou o poder da laranja, notando que já existem vários estudos que «indicam que uma dieta rica em frutos e vegetais está associada a uma diminuição do risco de desenvolvimento de cancro colorectal».
Com esta nova investigação nacional, ficou agora a saber-se que aquela casca «em particular um composto chamado tangeritina que existe apenas na casca dos citrinos, inibe a proliferação de células cancerígenas e reduz a população de células estaminais cancerígenas» – consideradas responsáveis pela iniciação do cancro, a sua reincidência e a resistência a certos tratamentos. A novidade sobre o potencial deste alimento poderá, sublinha Teresa Serra, «fornecer informações importantes para o desenvolvimento de novos produtos que podem ser usados como coadjuvantes de quimioterapia e contribuir para definir intervenções nutricionais em humanos direccionadas para a terapia do cancro colorectal». Doença que, todos os dias, mata 11 portugueses.
É exactamente a descobrir o papel dos alimentos nas doenças que se dedica a investigadora Rosário Bronze. No laboratório que dirige testam-se e identificam-se os alimentos e resíduos de alimentos que podem ter efeito terapêutico.
Outra investigação recente analisou o impacto do azeite nas doenças cardiovasculares. Para isso, colocaram-se 69 voluntários a consumir diariamente 20 ml de azeite cru durante seis semanas. O estudo foi feito em colaboração com a Universidade de Glasgow, na Escócia, e os voluntários eram todos escoceses, o que se deveu ao facto de, explica, ser uma população que habitualmente não consome azeite. Conclusão: no fim das seis semanas todos registaram uma redução de biomarcadores de doença cardiovascular. E isto independentemente do teor em compostos fenólicos do azeite ser alto ou baixo. «Uma alimentação saudável ajuda a prevenir o aparecimento de doenças, nomeadamente das não transmissíveis como diabetes, cancro, doenças cardiovasculares, que constituem actualmente, nas sociedades mais evoluídas, um problema de saúde pública», avisa Rosário Bronze, notando que os alimentos têm muitos compostos que desempenham funções importantes no organismo, que podem ajudar a prevenir o aparecimento de doenças, auxiliar na terapia ou actuar de forma a diminuir os efeitos secundários de um tratamento.
As frutas e saladas são outros dos alvos da investigação do IBET que está a tentar decifrar o seu impacto no cancro e noutras doenças, como as cardiovasculares, e também em processos inflamatórios, como a artrite reumatóide. Segundo Rosário Bronze, entre os frutos a ser analisados está a maçã Bravo de Esmolfe, a cereja da Cova da Beira e o figo da Índia. Já entre os vegetais encontra-se o bróculo e o agrião. Estão ainda a estudar o efeito do vinho na diabetes. E tudo indica que, com moderação, pode ter uma acção benéfica na absorção de açúcar.
Hoje em dia já é um dado inequívoco para a comunidade científica a estreita relação entre a alimentação e a diabetes. O Programa de Prevenção da Diabetes americano comparou dois grupos de pessoas com diabetes tipo 2. Uns tomaram o medicamento que controla o açúcar no sangue (a metformina), enquanto outros fizeram uma dieta com baixo teor de gorduras saturadas, açúcar e sal, e rica em proteína magra, frutas e vegetais frescos. E se os primeiros conseguiram diminuir em 30% o risco de desenvolverem diabetes, os que mudaram a alimentação viram o risco descer em 58%.
«A alimentação contribui muito para o desenvolvimento da diabetes, nomeadamente a diabetes Mellitus tipo 2», confirma a médica a Paula Pereira, especialista em medicina interna, no Hospital Lusíadas Porto, esclarecendo: «Quando nos alimentamos os nutrientes passam para o sangue. A glicose (açúcar) para ser transportada para os órgãos e tecidos necessita de insulina, que é produzida no pâncreas. Quando estimulamos em demasia o pâncreas, com refeições copiosas, excesso de açúcares e gorduras, este vai produzindo mais insulina até que entra em falência”. No entanto, há boas notícias: se um paciente alterar a forma de se alimentar pode reverter a doença. «Na fase em que o pâncreas ainda produz insulina, claro que se alterarmos a alimentação, reduzirmos o peso e fizermos actividade física, podemos reverter por completo a diabetes». Mário Espiga, antigo vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia e igualmente médico dos Lusíadas Porto, diz também não haver dúvidas de que os hábitos alimentares são decisivos para o coração: «Uma alimentação pode não ser excessiva sob o ponto de vista calórico, mas se tiver excesso de sal leva ao aparecimento futuro de hipertensão arterial ou o agravamento de uma hipertensão já existente». Por outro lado, acrescenta, o «excesso de gorduras na alimentação fomenta o desenvolvimento precoce de aterosclerose (distúrbio do coração), que tem como consequências o enfarte do miocárdio e o acidente vascular cerebral. Nos portugueses há, entre outros, dois hábitos que o médico considera perigosos: os sumos que estão à venda e que têm na sua constituição excesso de hidratos de carbono, que são uma forma de ingestão “disfarçada” de excesso de açúcar e o costume de comer enchidos, que leva ao consumo excessivo de sal e gorduras. E o sal, esse, é um dos maiores riscos, pois os portugueses consomem o dobro do que deviam.
Apesar dos benefícios dos vegetais e das frutas, e dos riscos de muitos alimentos, a população portuguesa continua a comer mal. O que resulta em adolescentes com excesso de peso e risco de baixo QI; adultos a morrer de mais enfartes, a serem atingidos pelo cancro e propensos à depressão e idosos a sofrer de diabetes e de demência. Para a comunidade científica há uma palavra que explica este cenário em que se encontra a saúde dos portugueses: alimentação.
Hoje, garantem os especialistas, é certo que “somos o que comemos”. Conceição Calhau, professora doutorada da Nova Medical School, sublinha que há evidências científicas de que os erros alimentares estão a determinar as doenças, em especial as crónicas, que os portugueses estão ou vão desenvolver nos próximos anos e tudo o que isso tem de impacto físico, social e económico.«O consumo da carne vermelha, a falta de leguminosas, o excesso de refrigerantes, a pouca quantidade de água, o consumo em dobro do sal, o açúcar, os alimentos processados e as gorduras saturadas são a justificação para o padrão actual de doenças, nomeadamente excesso de peso, hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, demência…»
Esta última é, aliás, considerada uma das novas epidemias. Neste momento, afecta 47 milhões de pessoas no mundo e teme-se que o número triplique até 2050. Em Portugal, a situação também é alarmante: a sua prevalência em pessoas com mais de 60 anos é de 5,91%. Ou seja, 160 mil afectados, com base no estudo Epidemiologia da Demência e da Doença de Alzheimer em Portugal: Estimativas da Prevalência e dos Encargos Financeiros com a Medicação, publicado em 2013.
O peixe pode, no entanto, ser um aliado dos portugueses no que se refere ao Alzheimer. O facto de consumirem mais pescado do que outras populações pode ajudar no combate a esta doença. É que este ano de 2019, um grupo de investigadores do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) descobriu uma particularidade nacional: no país, a demência mais prevalente parece ser a que está mais relacionada com o estilo de vida, a chamada demência vascular. Uma situação um pouco diferente da tendência do resto dos países da Europa Ocidental, onde o Alzheimer é a forma da demência mais comum, explicam no estudo Prevalence and Causes of Cognitive Impairment and Dementia in a Population-Based Cohort From Northern Portugal, em que estudaram 730 indivíduos. Segundo os autores deste trabalho – publicado na revista “American Journal of Alzheimer’s Disease & Other Dementias” – o facto de os portugueses serem mais sensíveis à demência vascular pode estar relacionada com a elevada incidência dos acidentes vasculares cerebrais. Outra hipótese, acreditam os especialistas, pode ser resultado do consumo de peixe, em particularmente de peixe gordo, que parece estar associado a menor risco de problemas de demência e Alzheimer. Aliás, o poder da alimentação como factor protetor contra a doença levou a Direcção-Geral de Saúde (DGS) a emitir um manual de Nutrição e doença de Alzheimer”, onde sugere alimentos e suplementos que podem ajudar e recorda que um em cada três casos de demência podiam ser evitados com estilos de vida saudável.
O poder do ómega 3 neste tipo de problemas tem sido descrito em vários trabalhos. «Está sem dúvida relacionado com a saúde mental. Assim como os frutos vermelhos estão relacionados com a memória», sublinha Conceição Calhau, notando que tudo indica que na saúde mental há também interferência das bactérias que vivem na flora intestinal e que serão responsáveis por muito do que acontece no organismo. Bactérias que são influenciadas pela alimentação e que estão neste momento a ser uma das grandes apostas de cientistas em todo o mundo. Acredita-se que são uma chave essencial para a descodificação de algumas doenças e da sua prevenção e tratamento.
Chamada actualmente de microbiota intestinal, este conjunto composto por 100 mil milhões de microorganismos – entre bactérias, fungos, vírus e leveduras – que vivem no intestino desempenham várias funções no organismo, entre elas a de proteger contra doenças, modelar o sistema imunitário, absorver os nutrientes e determinar os quilos que se engordam. Há assim bactérias boas e más que protegem ou atacam e, explica Conceição Calhau, a quantidade de cada grupo é determinada, em parte, por aquilo que se come. «Sabe-se que a presença de hortícolas, alimentos naturalmente ricos em fibras e em fitoquímicos, são importantes para a manutenção e crescimento de um conjunto de bactérias benéficas ao organismo, produtoras de ácidos gordos que são protectores, adianta. E acrescenta: «Por outro lado, o consumo deficiente de hortícolas, acompanhado do consumo expressivo de produtos de origem animal, que são fontes de fosfatidilcolina, carnitina ou colina, levam ao predomínio de outro tipo de bactérias que, por exemplo, metabolizam a colina ou a carnitina presentes nas carnes, em trimetilamina, que origina no nosso organismo óxido de trimetilamina (TMAO), reconhecido actualmente como biomarcador de risco cardiovascular».
Por isso, nos laboratórios de todo o mundo se aposta na investigação desta flora que tem impacto na saúde e nos mecanismos moleculares que levam à doença. É até encarada como se fosse um órgão novo, nota Conceição Calhau.
Neste momento, em Espanha, está a realizar-se um recrutamento de voluntários para que um grupo de especialistas possa identificar a flora intestinal dos espanhóis. Trata-se de um projecto de uma universidade e o objectivo é obter um retrato-robô da flora intestinal ibérica. «Com o mapa podemos calcular o risco de se desenvolverem possíveis doenças. Há determinadas bactérias que, quando aumentam, permitem calcular o risco de obesidade e de doenças cardiovasculares e predisposição para a diabetes. Em outros casos, a presença dessas bactérias permite ajustar o tratamento da diabetes», explica Luís Collado, professor da faculdade de Medicina daquela universidade e director deste projecto.
Ter o perfil desta zona do corpo humano pode ser uma valiosa arma. «Já se sabe que o desequilíbrio da flora intestinal (um problema conhecido como disbiose intestinal) potencia a resistência à insulina e o desenvolvimento da depressão», alerta Conceição Calhau, lembrando que está já a ser testado em ensaio clínico um medicamento que inibe uma enzima presente em algumas bactérias intestinais e que é um factor de risco cardiovascular. «Este ensaio reforça o interesse já médico e farmacêutico no reconhecimento de que no microbiota está a origem de risco de doença». Mas não só. Estudos internacionais mostram, por exemplo, que os pacientes com artrite reumatóide têm alterações na população destas bactérias que habitam no intestino.
Assim, o que comemos pode prevenir ou acelerar certos problemas de saúde, e mudar os alimentos que consumimos pode ter um efeito idêntico ao de um medicamento. «A alimentação e nutrição são factores decisivos para ter saúde e doença», concorda Alexandra Bento, bastonária dos nutricionistas, garantindo que o segredo está na dieta mediterrânica – que se baseia no consumo elevado de alimentos de origem vegetal, como vegetais, frutas, leguminosas, frutos secos, o uso do azeite como gordura principal, o consumo frequente de peixe fresco e pouco frequente de carne vermelha, o consumo moderado de laticínios e o consumo de água como bebida de eleição e consumo baixo de vinho.
Esta é, garantem os médicos, a arma mais poderosa para evitar doenças e até contribuir para o seu tratamento. O problema é que os portugueses não a estão a seguir: comem menos vegetais e mais gorduras, e até o vinho deixou de ser a bebida mais consumida, tendo sido ultrapassado pela cerveja em 1988. Mas segundo os dados do Inquérito Alimentar Nacional, 82% dos portugueses não aderem aos padrões da dieta mediterrânica.
Um estudo que analisou 25 mil mulheres e foi publicado em Dezembro passado na revista “JAMA” revela um dos segredos deste tipo de alimentação: o seu poder anti-inflamatório. «Descobrimos que a dieta mediterrânica reduz os níveis de inflamação – um enorme factor de risco para a doença cardiovascular» , explicou na época o médico e investigador da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard, Shafqat Ahmad, que coordenou o projecto. Ao ser anti-inflamatória, a dieta mediterrânica consegue também ser útil em doenças auto-imunes, como a esclerose múltipla e o lúpus. A Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM), por exemplo, cita no seu boletim um estudo que indica que os doentes que seguem uma dieta equilibrada conseguem obter uma redução de 20% na perda de capacidade física e cognitiva associada à doença, quando comparada com os que comem gorduras saturadas.
A verdade é que o que comemos reflecte a vida social, económica e cultural do país. E o tipo de alimentação acaba por registar as mudanças na sociedade portuguesa ao longo das décadas: as crises financeiras, os anos de opulência, o nível social da população, a evolução do PIB, os alertas de saúde pública, tudo se reflecte nos alimentos que se comem e estes no organismo.
«O crescimento do PIB per capita, ao longo dos anos, reflectiu-se de modo semelhante na estrutura do padrão nutricional dos portugueses», concluiu um grupo de especialistas portuguesas que analisou a Evolução das disponibilidades alimentares e nutricionais e do Produto Interno Bruto ao longo de quatro décadas.
Feita a análise, facilmente foi detectado um fenómeno. “À medida que o PIB per capita aumenta, a proporção de proteínas cresce, verificando-se, pelo contrário, uma diminuição dos hidratos de carbono e do etanol”, explicam no estudo publicado este ano na Acta Portuguesa de Nutrição as suas autoras (Alexandra Bento, da Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa, Tânia Cordeiro, da Universidade Fernando Pessoa, Carla Gonçalves, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e Maria Vaz de Almeida, da Faculdade Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto).
E se nos anos 90, descritos “como de riqueza e crescimento económico”, se verificou “o maior consumo de açúcar e adoçantes, produtos de leite e carne, pescado e ovos”, quando em 2002 a economia portuguesa entrou numa fase de estagnação ou recessão, com elevadas taxas de desemprego, que culminou com o pedido de resgate financeiro à Comissão Europeia em 2011, a alimentação mudou. “Esta fase coincidiu com a estabilização e diminuição do consumo aparente de vários alimentos, como os do grupo dos cereais e tubérculos (a partir de 2006), do leite (a partir de 2007) e da carne, pescado e ovos (com estabilização entre 2000-2006 e diminuição a partir de 2007)”.
Verificou-se ainda que, ao longo dos anos, aumentou o valor calórico que os portugueses ingeriam. “A melhoria do desempenho económico do país foi acompanhado pelo aumento da disponibilidade energética”. Em 1974 havia um aporte energético de 3050 kcal por dia, enquanto que em 2013 era de 3477 kcal diárias -um aumento de 427 kcal/dia/pessoa.
Estes valores continuam a crescer e, segundo os últimos dados da Balança Alimentar Portuguesa 2012-2016, “há um aporte calórico diário médio disponível para consumo por habitante de 3834 kcal” − muito superior às 2000 kcal por habitante por dia recomendadas. “Permitiria satisfazer as necessidades de consumo de 1,6 a 2 adultos”, concluem as nutricionistas naquele estudo.
Não são por isso de estranhar os números de obesidade: 6 em cada 10 portugueses são obesos ou pré-obesos, segundo o estudo de Andreia Oliveira, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, que em 2017, pela primeira vez, estimou a prevalência da obesidade no país nos vários escalões etários. Conclusão: a obesidade é superior nas mulheres, nos mais idosos e os homens são os mais afectados na gordura abdominal. Os 15 anos de idade são a fase da vida onde a obesidade começa a aumentar, em parte devido ao baixo consumo de frutas e hortícolas, elevada ingestão de refrigerantes e à inactividade. E, ao contrário do que sucede em muitos países, em Portugal a obesidade infantil continua a crescer, alertaram recentemente investigadores do mesmo instituto, notando que mais de um quarto das crianças com 10 anos têm excesso de peso.
Quando se fala de peso, o estrato social parece ser decisivo, tendo uma estreita relação com a alimentação. A investigadora Andreia Oliveira descobriu que a obesidade é mais comum não só entre as mulheres e os mais velhos, mas também nos menos escolarizados. Um cenário confirmado por um outro trabalho do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge sobre o tema onde se refere que “os adultos portugueses com menor nível de escolaridade tinham maior prevalência de obesidade (39,4%)”.
Certo é que actualmente quase metade da população portuguesa apresenta excesso de peso e perto de um milhão de adultos sofre de obesidade. O exagerado consumo de açúcar é um dos alarmes − tendo já saído notícias que indicavam que se consome uma média de 16 pacotes de açúcar por dia. Entre os adolescentes, um dos maiores perigos é o consumo de refrigerantes e estudos recentes indicam que um terço dos consumidores com mais de 15 anos ingere este tipo de bebida.
Nos mais novos há ainda outras falhas graves na alimentação com impacto na saúde. É o caso da falta de iodo. As crianças portuguesas apresentam níveis de iodo abaixo dos padrões recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) . Vários estudos têm relacionado a diminuição do QI, entre 8 e 15 pontos, como eventual consequência desta falta de iodo. Uma situação que levou a OMS a alertar para a “redução da capacidade intelectual em casa, na escola e no trabalho”. Este é um dos temas que preocupa Conceição Calhau, que tem alertado para o problema, chegando a ir em 2016 à Assembleia da República defender a obrigatoriedade de uso de sal iodado no consumo doméstico. A nutricionista fez também uma pesquisa em 84 escolas e verificou que, apesar das recomendações, nenhuma usava este sal nas suas refeições. Agora, a DGS decidiu incluir este aspecto nas novas Orientações sobre Ementas e Refeitórios Escolares para este ano lectivo de 2018-2019, sugerindo que o sal a existir seja iodado.
A somar a todos estes problemas de alimentação surgiu um novo, muito recentemente: a internet, os blogues de nutrição e os peritos virtuais que dão sugestões. Em cada 10 influencers de saúde, nove não fazem ideia do que estão a dizer. O alerta foi dado num estudo apresentado no Congresso Europeu de Obesidade, em Glasgow, em Abril e Maio deste ano. Os investigadores da Universidade de Glasgow, na Escócia, descobriram que apenas um em cada 10 baseava o seu conteúdo em conhecimento científico e era imparcial nos produtos e marcas que recomenda. A bastonária dos nutricionistas, Alexandra Bento, confirma a nova tendência e diz que têm chegado à Ordem várias queixas. «Mas são difíceis de resolver, pois é complicado actuar no mundo virtual». A especialista aproveita para lembrar que há cada vez mais mensagens erradas a circular na internet que podem influenciar erradamente nas escolhas da alimentação. Escolhas que podem ser a diferença entre viver com saúde ou a lutar contra várias doenças.
O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor