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Floresta

A floresta portuguesa num carvalhal à venda

“Portugal terá direito a uma fatia de quase 17 mil milhões e já decidiu aplicar 615 milhões nas florestas. Quase a metade será destinada ao Programa de Transformação da Paisagem, criado há um ano para colocar em prática algo de que se fala há décadas: mudar a forma de ocupação do solo pelas florestas – por exemplo, diversificando as espécies – para reduzir a sua vulnerabilidade. Mas não é certo que se vejam resultados rapidamente.»
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«Vende-se», dizia a placa à beira da estrada. O objeto era uma propriedade que, embora agrícola, situava-se no meio de uma aldeia, no concelho de Vouzela. Não era exatamente o que queriam os fundadores da Montis, uma associação de gestão e conservação da natureza recém-criada naquele ano de 2014. A associação andava à procura de terrenos rurais baratos que pudessem comprar e gerir. “Resolvemos ligar [para o proprietário], ele tinha mais uns terrenos no monte, em que ninguém estava interessado”, relembra Henrique Pereira dos Santos, um dos dirigentes da associação.

A pouca apetência comercial daquelas parcelas era tal que o proprietário aceitou esperar alguns meses, até que a Montis conseguisse lançar uma campanha de crowdfunding. No final, reuniram-se 16 mil euros e a associação adquiriu 5,5 hectares de carvalhais em recuperação de um incêndio, dez anos antes, na Serra do Caramulo, com um único objetivo: melhorar o capital natural do que lá estava. “O que nós queremos é aumentar o valor de conservação dos terrenos que ninguém sabe o que fazer com eles”, explica Henrique Pereira dos Santos.

Integrados neste pequeno episódio, estão vários elementos que se cruzam na floresta portuguesa. O minifúndio, o desinteresse por áreas improdutivas, o abandono da floresta, a sua importância ecológica, o dinheiro para financiar a sua proteção, a chaga dos incêndios. Não chegam para descrever o que são os espaços florestais do país, onde largas áreas são produtivas, bem geridas e sustentam importantes setores económicos. Mas mostram dilemas centrais que estão na base de muitos problemas.

Um deles é como fazer com que a gestão do potencial natural das florestas, aumentando o valor dos chamados “serviços dos ecossistemas”, seja de alguma forma recompensada pela sociedade. Pode parecer uma questão teórica, quase filosófica. Mas não é. Uma floresta em crescimento absorve dióxido de carbono da atmosfera, minimizando o risco das alterações climáticas. As florestas também ajudam a proteger recursos hídricos e evitar a erosão dos solos. Promovem, ainda, a biodiversidade, com benefícios em cascata – da exploração de outros produtos naturais a usos recreativos.

Quanto vale a floresta?

Tudo isto tem um valor que não está oficialmente contabilizado. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, a floresta portuguesa valia 1380 milhões de euros em 2018, equivalente a 0,7% do PIB. Cerca de dois terços deste montante referem-se ao que floresta produziu nesse ano – sobretudo cortiça e madeira para a indústria de papel e de aglomerados. O terço restante resulta de serviços silvícolas, como plantar árvores ou gerir espaços florestais. Os serviços dos ecossistemas não entram nas contas.

«O nosso problema é que temos uma grande carência de estudos de base para estimar o valor económico dos ecossistemas», afirma Américo Mendes, professor de economia da Católica Porto Business School. Há duas décadas, Américo Mendes produziu uma primeira aproximação do quanto representariam tais serviços. Agora, está a atualizar os números. À produção de bens, Mendes acrescentou um valor estimado para a caça e para os usos recreativos da floresta. Além disso, estimou o valor das emissões evitadas de CO2, calculou quanto as administrações públicas gastam com a conservação da natureza e também quanto se poupa com a proteção dos recursos hídricos e dos solos.

Os resultados preliminares, divulgados em Fevereiro numa apresentação no site florestas.pt, dão uma noção da ordem de grandeza do se está a falar. O valor económico bruto da produção florestal, assim calculado, chega a 1764 milhões de euros. Quase a metade – 779 milhões de euros – corresponde aos bens públicos que a floresta proporciona a nível ambiental. «Não é surpreendente. É até possível que a componente dos serviços dos ecossistemas esteja a ser subestimada», avalia Américo Mendes.

De 7% a 36% do território

Indiferente à magnitude deste valor, a floresta em Portugal evoluiu ao longo das décadas agarrada a outra lógica, a do rendimento mais imediato. Em 1875, apenas 7% do Continente eram ocupados por povoamentos florestais, sobretudo de sobreiros, azinheiras e pinheiros. Nos montes e vales, viam-se mais pedras e matos do que árvores. Em 2015, a área florestada era já cinco vezes maior, chegando a 36% do território – segundo o mais recente Inquérito Florestal Nacional. Primeiro expandiram-se os pinhais, depois, a partir dos anos 1970, os eucaliptais – ambos de crescimento rápido. O eucalipto subiu ao pódio nessa corrida e hoje responde por 26% de toda a floresta. A seguir vêm o sobreiro e o pinheiro-bravo, ambos com 22%, a azinheira (11%) e o pinheiro-manso (6%). A floresta cresceu sobretudo em função de investimentos para gerar algo que se pudesse vender rapidamente. “Não havendo incentivos económicos, a tendência continuará a ser esta”, antecipa Américo Mendes.

O sobreiro é avaliado como a espécie florestal com maior valor potencial, segundo um estudo comparativo realizado em 2014 pelas economistas Ana Faria Lopes, da Universidade de Kiel, na Alemanha, e Maria Antonieta Cunha e Sá, da Nova School of Business Economics, em Portugal. Cada hectare de montado produzia, então, 491 euros por ano – 355 euros em bens comercializáveis e 136 euros em serviços ambientais. O eucalipto e o pinheiro-bravo ficavam-se pouco abaixo dos 400 euros por hectare. Mas, contrariamente à fama que carregam, produziam mais em valor ambiental, por conta da sua capacidade de absorver carbono da atmosfera em pouco tempo. O troféu de campeão na contabilidade ecológica cabe aos carvalhais, sobretudo pelo seu alto valor recreativo, para a biodiversidade e para a proteção dos recursos hídricos. Mas por cada hectare de carvalhos em Portugal, há hoje de dez eucaliptos, de nove pinheiros-bravos e nove de sobreiros.

Cortiça importada

Enquanto se ampliaram pinhais e eucaliptais, a área ocupada por sobreiros manteve-se relativamente estável. Até caiu ligeiramente entre 1995 e 2010 – cerca de 4% – voltando a subir em 2015. A Associação Portuguesa de Cortiça (APCOR) estima que nos últimos dez anos houve um aumento de 3%. É um valor pouco expressivo, para um setor que está apostado em aumentar a procura pela cortiça, como um material versátil e ecológico para muitas aplicações além da rolha – na construção, transportes, vestuário, desporto, cosmética e até em naves espaciais.

O aumento da procura cria a necessidade de mais matéria-prima, que a floresta nacional, sozinha, não consegue suprir. Em 2019, foram importadas 44 mil toneladas de cortiça, de Espanha e dos países do Norte de África, para se juntar à produção nacional e alimentar a indústria corticeira. Algo terá de ser feito, se o setor quiser crescer mais. “Uma das estratégias é tornar os montados mais produtivos”, diz o presidente da APCOR, João Rui Ferreira. Na prática, isto implica plantar mais árvores e recuperar montados em zonas com elevada mortalidade, devido a uma doença que afeta os sobreiros em Portugal há décadas.

Outros caminhos estão a ser tentados. Um deles é um método de rega do montado para acelerar o seu crescimento inicial, num projeto desenvolvido pela Corticeira Amorim em parceria com a Universidade de Évora – o Irricork. “Pode-se fazer a primeira extração da cortiça aos 10 anos. O normal são 25. É viável, mas é preciso mecanismos de apoio para a instalação destes sistemas de rega”, explica João Ferreira.

Tais esforços visam melhorar a oferta de matéria-prima para uma indústria cujas exportações geraram cerca de mil milhões de euros em 2019. Mais uma vez, nas contas do que o montado produz não entra a sua valia ambiental. «Ainda não, e penso que este é um grande desafio», refere o presidente da APCOR.

Os eucaliptos servem a uma indústria ainda mais pujante. Em 2019, Portugal exportou cerca 2,6 mil milhões de euros de papel, pasta de papel e cartão. O valor representa 51% de todas as exportações associadas à fileira florestal. Um em cada seis hectares de eucaliptais é gerido diretamente pelas empresas da indústria papeleira, segundo dados da CELPA, a associação representativa do setor. Os outros cinco estão nas mãos de proprietários privados não industriais, repartidos sobretudo em pequenas parcelas – o padrão dos espaços florestais do país.

Mais e maiores incêndios

Não é apenas um padrão, mas um problema. O êxodo rural a partir dos anos 1960 deixou as florestas ao abandono. Antes, cada pequeno quinhão era minimamente cuidado por quem dele dependia. Sem pessoas, as florestas cresceram descontroladamente, a biomassa se acumulou e abriu-se a porta aos incêndios. Segundo dados do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, entre 1990 e 2020, as chamas consumira 3,9 milhões de hectares de verde no país, mais do que toda área atual de povoamentos florestais – 3,2 milhões de hectares. Os fogos tornaram-se gigantescos. Em 2017, o ano mais trágico dos incêndios florestais, chegaram a arder áreas contínuas de mais de 60 mil hectares em questão de dias.

Com o clima em mutação, o cenário para o futuro não é animador. A temperatura média deverá aumentar substancialmente em Portugal, segundo cenários desenvolvidos por investigadores do Instituto Dom Luiz, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. No final desde século, os dias poderão ser 4,0 graus Celsius mais quentes e as noites, 3,4. Os verões serão mais escaldantes e em quase todo o território continental a média das temperaturas máximas na época estival estará acima dos 30 graus. Em Beja e Évora, a média ultrapassará os 36 graus – como se todos os dias de Julho a Setembro, sem exceção, os termómetros chegassem a esse nível. No Nordeste transmontano, a diferença em relação aos valores atuais pode atingir aos seis graus.

O Verão não será apenas mais quente, como também mais longo. Com menos chuva prevista ao longo do ano e a vegetação por isso mais seca, estarão criadas as condições ideais para que os fogos surjam mais cedo e abrandem mais tarde. Foi exatamente o que aconteceu em 2017. Os grandes incêndios desse ano, em que morreram 116 pessoas, deflagraram nos dias 17 de junho, ainda na Primavera, e 15 de outubro, já no Outono. “A definição da época de incêndios tem de estar presa ao clima”, afirma o climatologista Pedro Matos Soares, do Instituto Dom Luiz.

Pedro Soares chama a atenção, também, para o efeito combinado de extremos climáticos – como o que, mais uma vez, ocorreu há quatro anos: temperaturas infernais e fortes ventos resultantes de uma invulgar tempestade tropical no Atlântico Nordeste, o furacão Ofélia. «O que aconteceu em 2017 é uma ilustração do que pode acontecer no futuro», afirma o climatologista.

Carvalhos e castanheiros em risco

A meteorologia, no entanto, não diz tudo sobre a vulnerabilidade da floresta aos fogos. “Com o clima a mudar, a vegetação também pode mudar e não é certo que esta relação atmosférica de causa e efeito se mantenha”, opina Paulo Fernandes, investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e especialista em fogos florestais. «A grande dificuldade está em saber como vai evoluir a paisagem», acrescenta.

Paulo Fernandes é um dos autores de um estudo publicado em 2016 que procurou responder a esta pergunta. Os resultados sugerem que, num Portugal mais quente, sobreiros, pinheiros-bravos e eucaliptos não terão as mesmas condições para vingar em algumas regiões onde hoje estão plantados. Se as árvores se movessem como aves, estas espécies migrariam rapidamente mais para Norte.

As espécies potencialmente mais afetadas serão, no entanto, outras. Carvalhos e castanheiros, em particular, vão sofrer e só encontrarão condições ideais em elevadas altitudes. E hoje já se notam sinais desta preferência. Paulo Fernandes conta que a Serra da Padrela, que chega a 1100 metros de altitude, está a ser arborizada com castanheiros, antes raros na região. No entanto, quanto mais altas forem as aspirações geográficas destas espécies, menos locais terão elas para sobreviver decentemente e plantá-las pode ser um erro. «Neste contexto das alterações climáticas, é bastante irrealista», diz o investigador.

Em seis horas, ardeu tudo

Quase tudo o que se fez para pôr ordem na floresta nas últimas duas décadas foi estimulado por trágicos incêndios que aterrorizaram o país. A política florestal levou uma reviravolta depois dos fogos de 2003 e 2005, que juntos aniquilaram 765 mil hectares ocupados por árvores e matos. Criaram-se as zonas de intervenção florestal (ZIF), onde pequenos proprietários se juntariam para gerir melhor suas florestas. Até 2020, havia 246. A primeira nasceu em 2006, em Oliveira do Hospital. Desde então, a associação florestal Caule gere aquela ZIF e mais onze adjacentes, em concelhos da região, reunindo 6500 proprietários. Executaram-se planos de controlo de combustíveis e de combate a doenças e pragas, fizeram-se ações de sensibilização e tratou-se de atualizar o cadastro das propriedades.

Durante anos, os fogos não causaram grande transtorno. Até chegar a outubro de 2017, com o seu calor sufocante e o furacão Ofélia. Em seis horas, ardeu tudo. «Nada funcionou. Não havia nada a fazer», recorda João Vasco Campos, presidente da Caule. «Os proprietários estão totalmente desmotivados. A grande maioria já acha que isso não tem solução. As pessoas estão apáticas. Como é para arder, não querem mais investir dinheiro», completa.

Vasco Campos diz que é preciso melhorar o financiamento às zonas de intervenção florestal. «Continuo a acreditar no modelo das ZIF. Mas não funcionam se não houver apoios públicos», refere.

Para Henrique Pereira dos Santos, da associação Montis, não vale a pena imaginar a floresta sem incêndios. «Trabalhamos sempre no pressuposto de que os terrenos que gerimos vão arder. Não é uma probabilidade, é uma certeza», diz. A Montis não planta novas árvores, mas espera que se recuperem, intervindo apenas para priorizar as mais capazes. Dar mais atenção a carvalhos que rebentem de copa depois de um incêndio, por exemplo, garantem quatro a cinco anos de ganho na restauração da floresta que antes havia. Fogos controlados e outras medidas de gestão ajudam a aumentar a resistência da vegetação às chamas.

Quem paga a preservação?

O que a associação Montis pretende, exclusivamente, é aumentar o capital natural dos cerca de 180 hectares de área verde que atualmente gere, independente do seu estado inicial. «Podemos até partir do zero ou do negativo, com um terreno cheio de mimosas», afirma Henrique Pereira dos Santos. Na escala da floresta portuguesa, é mais um projeto demonstrativo do que um modelo viável de gestão. Mesmo porque, não há benefício económico, pelo contrário. «O modelo é caro e não dá retorno», diz Pereira dos Santos.

Depois dos fogos de 2017, que queimaram 500 mil hectares de florestas e matos, o Governo criou uma nova figura para superar as limitações do minifúndio: as áreas integradas de gestão da paisagem (AIGP). O intuito é o mesmo: gerir em comum várias propriedades ao mesmo tempo, para prevenir fogos, preservar a natureza e potenciar a economia.

Conciliar a produção e a proteção, no entanto, é uma aspiração ainda mal resolvida na floresta portuguesa. É preciso dinheiro para que o segundo elemento da equação seja remunerado. Embora modestos, já existem alguns mecanismos. O Fundo Florestal Permanente, criado em 2004, é um deles. O fundo é alimentado com uma parte do Imposto sobre Produtos Petrolíferos. Ou seja, quem anda de automóvel, e por isso polui a atmosfera, é obrigado a contribuir para o financiamento das florestas.

Em 2019, o fundo investiu cerca de 43 milhões de euros, dos quais 76% foram para a prevenção e combate de incêndios. O economista Américo Mendes lamenta que uma grande fatia do dinheiro seja direcionada ao financiamento de estruturas da própria administração pública. «Uma parte deste valor não é para apoiar os produtores florestais», refere.

15% da floresta certificada

Indiretamente, a certificação ambiental das florestas é outro mecanismo que está a trazer algum benefício aos produtores. Cerca 15% da área florestal do país, totalizando 512 mil hectares, estão certificados pelo FSC (Forest Stewardship Council), o selo de garantia ambiental mais comum no país. Aproximadamente 46% desta área correspondem a eucaliptais, 30% a montados de sobro e 8% a pinhais. A lista de exigências para a certificação é longa e vai desde a identificação e preservação de valores naturais, a condições de trabalho e à relação com as comunidades locais. Organismos geneticamente modificados são proibidos, alguns pesticidas não podem ser utilizados, é preciso controlar as espécies invasoras e prevenir os incêndios.

Joana Faria, secretária executiva da FSC Portugal, conta que alguns proprietários florestais ficam admirados quando começam a ver o que há nos seus terrenos. «Às vezes, orgulham-se de saber que têm uma espécie protegida», afirma.

A certificação é cada vez mais uma exigência do consumidor. «Verificamos que há agora uma maior consciência da sociedade civil», diz Joana Faria. Com isso, a indústria transformadora também está a aderir. Em 2020, houve um aumento de 20% no número de empresas certificadas em Portugal, como produtores de papel ou de embalagens. Hoje são 482 e cada uma tem de garantir que os produtos florestais que utilizam está certificado em toda a sua cadeia, desde a floresta até à fábrica ou ao ponto de venda ao consumidor. E o produtor florestal acaba por receber um prémio. A madeira de eucaliptos certificada, por exemplo, vale quatro euros por tonelada a mais do que a não certificada.

Mais financiamento de Bruxelas

A chamada bazuca europeia – a montanha de recursos agora disponível para relançar a economia da União Europeia nos pós-Covid – pode vir a ter um grande impacto nas florestas. O orçamento da UE para os próximos sete anos estipula que 30% dos fundos devem ser gastos no combate às alterações climáticas e 10%, a partir de 2026, na proteção da biodiversidade. E dos 673 mil milhões de euros do novo Mecanismo de Recuperação e Resiliência, criado pela UE extra orçamento, para ajudar a vencer a crise, 37% também serão para projetos com uma componente climática.

Portugal terá direito a uma fatia de quase 17 mil milhões e já decidiu aplicar 615 milhões nas florestas. Quase a metade será destinada ao Programa de Transformação da Paisagem, criado há um ano para colocar em prática algo de que se fala há décadas: mudar a forma de ocupação do solo pelas florestas – por exemplo, diversificando as espécies – para reduzir a sua vulnerabilidade. Mas não é certo que se vejam resultados rapidamente. «É extremamente difícil mudar a paisagem», vaticina o investigador Paulo Fernandes, da UTAD.

A floresta do futuro

Quando se pergunta à bióloga Helena Freitas, coordenadora do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra, que tipo de floresta Portugal poderá ter em 2050, a resposta é sombria. Teremos, diz a especialista, uma floresta menos produtiva – talvez a ponto de inviabilizar a exploração comercial dos eucaliptos – , mais doente e menos biodiversa. E as árvores da nossa paisagem darão, cada vez mais, lugar a espécies invasoras. «Dificilmente conseguiremos travar esta proliferação», antecipa.

Reverter estas tendências, numa floresta maioritariamente privada, não vai ser fácil, mas o dinheiro que aí vem de Bruxelas pode ajudar.  «A natureza nunca teve uma oportunidade como essa», afirma Helena Freitas. No entanto, não é certo que determinadas possibilidades que se abrem, como plantar mais árvores para sequestrar carbono, resultem de facto. “A narrativa do carbono é uma oportunidade, mas pode ser um flop”, opina.

Há um aspeto, segundo Helena Freitas, que não tem merecido a atenção que deveria. Fala-se muito das florestas que se perdem nos incêndios, mas pouco dos solos que se vão degradando ao mesmo tempo. «O substrato está cada vez mais fraco. No geral, temos um empobrecimento muito grande dos solos», explica. E uma árvore de grande porte só se aguenta de pé se tiver terra boa onde fincar suas raízes.

O tema, completa a bióloga, deveria ser levado muito mais a sério. Afinal o solo, a base das nossas florestas, é um elemento delicado de toda a equação ecológica. «Um centímetro [de espessura] de solo pode levar centenas de anos a constituir», alerta Helena Freitas.

 

O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor

 

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