«Todo o fenómeno do voto útil depende, em parte, dos efeitos das sondagens»
Temos eleições legislativas de 10 de março. As sondagens interferem muito na intenção de voto?
Sim, com certeza. Todo o fenómeno do voto útil depende, em parte, dos efeitos das sondagens.
Há também vários estudos que mostram que quando as sondagens dão conta de uma corrida renhida, a abstenção baixa. Já tenho mais dúvidas em relação a argumentos mais etéreos, como dizer que as pessoas gostam de estar com o vencedor [e por isso alteram o seu sentido de voto se ele for favorito nas sondagens].
O facto de, por vezes, existirem sondagens que apontam para resultados diferentes leva a que as pessoas não acreditem nestes inquéritos ou é sempre um dado a ter em conta para os eleitores?
Imagino, sem ter a certeza, que sondagens com resultados diferentes passem ao eleitor uma ideia de incerteza em relação ao resultado eleitoral - o que me parece muito saudável.
Quanto a acreditarem nas sondagens, devo dizer que dada a dimensão típica que assumem estes inquéritos em Portugal, mesmo que sejam feitos de forma perfeita, é normal que existam resultados bastante diferentes.
Os eleitores devem é desconfiar quando todas as sondagens apontam para o mesmo resultado. Aí sim, há motivos para pensar que alguma coisa de errado se passa com elas.
Há partidos que são mais prejudicados pelas sondagens? Qual a razão?
Há duas explicações. Por um lado, os eleitores podem estar mais ou menos predispostos a participar em inquéritos. Por exemplo, reformados terão mais tempo para responder a sondagens do que os trabalhadores, pelo que se os aposentados tenderam a votar mais nalgum partido, esse partido aparecerá favorecido nessa sondagem.
Por outro lado, algumas forças políticas podem ser prejudicadas pelo facto de os eleitores terem vergonha de assumir o seu voto.
Porque é que as sondagens dão sinal de que o governo PS está fragilizado, mas ao mesmo tempo o partido não é afetado de igual forma?
Sondagens sobre a qualidade do governo são diferentes de sondagens sobre quem se quer eleger para o governo. Uma coisa é achar que o executivo atuou mal, outra é achar que a alternativa é melhor.
Quais são hoje os maiores desafios das sondagens?
Conseguirem uma taxa de resposta seja bastante mais alta.
Havendo taxas de resposta baixas, é impossível ter a certeza de que os sondados representem, de facto, a população. Talvez pagando aos inquiridos se conseguisse fazer isso, mas sairá caro.
Pode dizer-se que as sondagens antecipam o resultado?
À partida, não. As sondagens são uma fotografia das intenções de voto e não da forma como as pessoas votam, o que, por estranho que pareça, é muito diferente.
Adicionalmente, há tantos fatores que podem levar uma sondagem a estar errada - desde o erro amostral, à distribuição de indecisos, passando por enviesamentos na amostra - que confundir um inquérito com um resultado final não faz sentido.
Qual é para si o melhor método de uma sondagem? Ou seja: o que é uma boa sondagem?
As melhores sondagens são aquelas realizadas com amostras aleatórias, urna fechada, feitas ao domicílio, onde se deve regressar caso os inquiridos não lá estejam e pagando ao sondado para garantir uma elevada taxa de resposta.
Fazer sondagens na rua, por telefone ou online têm pesos diferentes?
Sondagens online têm muito pouco valor porque a amostra é autoselecionada. Já no caso de estes inquéritos serem feitos na rua ou por telefone, não me parece problemático.
Quais os erros mais perigosos de uma sondagem?
Os erros maiores estão na interpretação das sondagens. Se as pessoas não as levarem demasiado a sério, por mais erradas que estejam, não é grave.
Em que eleição ocorrida em Portugal acha que as sondagens tiveram particular importância?
Nas últimas sondagens autárquicas, em Lisboa, ao passarem a ideia de uma grande vantagem do PS poderão ter contribuído para uma dispersão de votos à esquerda, permitindo a vitória de Carlos Moedas.
Porque é que há vitórias que nunca são vistas e antecipadas pelas sondagens? São erros das amostras ou mudanças de opinião pública que não são captadas?
Há exemplos históricos para ambos os casos. O resultado das últimas eleições legislativas é um bom exemplo. É muito provável que as sondagens tenham subestimado a vantagem do Partido Socialista porque não tinham forma de captar as decisões dos eleitores que foram tomadas já muito próximo das eleições.
Lá fora, o caso mais famoso foi a eleição presidencial de 1948, nos EUA (Harry Truman vs. Thomas Dewey). Chegou a haver uma capa de jornal a dar a vitória a Dewey, quando na realidade Truman tinha ganho. Com a incerteza que estas análises têm, é comum atribuir o erro ao facto de as sondagens não terem captado as mudanças de opinião da última semana de campanha. Mas esta é, quase de certeza, uma mistura das duas explicações.
Que explicações são essas?
Nessa altura, as amostras eram selecionadas de forma rudimentar e tornou-se evidente que entrevistaram as pessoas erradas. As casas de sondagens estavam tão seguras da vitória de Dewey que nem inquiriram a população na última semana. Assim, obviamente, falharam quaisquer mudanças na opinião pública nos últimos dias. Uma situação que levou a mudanças a esse nível.
Concorda com a expressão que os políticos costumam usar de: «As sondagens valem o que valem?»
Sim. Porque se valessem mais, não seriam necessárias eleições. Se todos concordamos que as sondagens não podem substituir as eleições, então, implicitamente, concordamos que não são decisivas.