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5 Leituras #17, por Inês Brasão: O hotel, do ponto de vista dos seus clientes e dos trabalhadores

5 Leituras #17, por Inês Brasão: O hotel, do ponto de vista dos seus clientes e dos trabalhadores

Sugestões de leitura de Inês Brasão, autora do livro «Hotel, os bastidores», publicado pela FFMS.
4 min
Novo artigo da rubrica «5 Leituras», em que um autor da Fundação sugere a leitura de cinco artigos publicados na internet, em língua portuguesa, espanhola ou inglesa. Desta vez publicamos as sugestões de Inês Brasão, autora do livro «Hotel, os bastidores».

 

Hotel
Artigo de Paulo Varela Gomes para o Público
(Em língua portuguesa)

Este pequeno ensaio de Paulo Varela Gomes sobre a relação do hóspede com o hotel abre-nos as portas para um tema singular dos nossos tempos: a crescente mobilidade em que vivemos, numa espécie de transumância de lugares a que nos habituámos, faz crescer em nós o desejo de que as casas provisórias (neste caso os hotéis) repliquem o sentimento de pertença e familiaridade que buscamos no lar. Cruzamo-nos com outros hóspedes, nos corredores e escadarias, nos cotovelos que roçam enquanto escolhemos os ovos mexidos servidos no buffet, mas essa proximidade é, afinal, tão querida quanto repelida, impelindo em nós uma enorme contradição. No hotel somos estranhos querendo ser reconhecidos e há um sentimento de não-lugar que, por vezes, nos afoga tanto quanto atrai.

Division, Segmentation, and Interpellation: The Embodied Labors of Migrant Workers in a Greater London Hotel
Artigo de Linda McDowell, Adina Batnitzky e Sarah Dyer
(Em língua inglesa)

Os hotéis tornaram-se uma espécie de “quinta essência” para os estudos sobre exploração e segregação laboral na esfera organizacional. Os imigrantes são contratados como mão-de-obra barata, dócil e vulnerável, dispondo-se a garantir a sobrevivência e estabilidade num país que não dominam, mas onde residem e querem permanecer. Acabam por ser contratados para os chamados “bottom-end jobs”, em regra trabalhos precários e temporários. O género e a nacionalidade continuam a funcionar como os grandes factores discriminadores no acesso à divisão social do trabalho. Com este ensaio entramos nos bastidores de um hotel de Londres, integrado numa cadeia multinacional, e que consegue a partir de uma boa bateria de dados (60 entrevistas) reflectir sobre estas formas de exploração e discriminação, nas quais os diferentes actores estereotipam os seus papéis a partir do lugar de classe que julgam interpretar, e que interpretam sobre “o outro”.

O hotel como locus intermediário do turismo sexual
Documentário da New Atlantis
(Em língua inglesa)           

Primeiro sob uma face mais escondida e desestruturada, curto circuitando o próprio sistema, hoje com uma expressão bem mais visível e preocupante, o turismo sexual cresce de ano para ano e ganha muitas nuances. Não por acaso, o seu crescimento intensificou-se no período pós-colonial. O turista sexual replica – mais ou menos conscientemente – as estratégias de dominação e objectificação dos corpos, desta feita centrando esse desejo de poder na predação sexual. Este documentário relata uma das expressões desse fenómeno, na qual o turista é do sexo feminino, e o corpo que se quer consumir, do sexo masculino. Tendo uma expressão muito menor que a inversa (em que o turista é do sexo masculino), permite-nos um olhar sobre aqueles que são alvo de busca de prazer sexual, no Senegal, e a forma como esse “mercado” determina a sua vivência quotidiana.

Maid in London
Blogue
(Em língua inglesa)

Não é possível entender a fluidez quotidiana de um hotel sem reconhecermos nesse espectro uma realidade essencialmente guiada pela performance. Ali, o trabalho invisível dos seus trabalhadores encena uma vivência sem feridas nem pequenos embaraços: tudo para que o hóspede deseje ficar e voltar. No blogue Maid in London, podemos aceder à voz daqueles que habitualmente não têm voz. Os seus relatos remetem para acontecimentos que nos ajudam a colocar na pele de quem trabalha nas categorias menos nobres da hotelaria, como o housekeeping. E, citando o quanto de performativo existe nesse mundo, um dos testemunhos recorda: «Over and over again, we crack the same smile and fake a laugh to massage the bloated egos of dreadful guests. My body is aching, it’s stiff, my legs feel as if they’re about to seize up from all the running (…).»

Nos bastidores de um hotel funerário japonês
Vídeo de Ben C. Solomon e Ainara Tiefenthäler para o New York Times
(Em língua inglesa)

Muito se tem discorrido acerca do papel crescente dos hotéis enquanto lugares que têm vindo a substituir funções outrora desempenhadas na esfera privada. Assim é com cerimónias ligadas a importantes estádios da vida dos indivíduos como casamentos, baptizados, luas-de-mel, aniversários, o Natal ou a passagem do ano. Este hotel dá um passo em frente. Permite-se ser um espaço onde é vivida a morte e o luto de um ente querido por parte de famílias japonesas. É, portanto, um hotel funerário, emprestando a dignidade, o silêncio e o recolhimento que a dor convoca, ao mesmo tempo que replica as condições necessárias a essa vivência enquanto experiência colectiva, quer no sentido da comoção, quer do acompanhamento da cerimónia fúnebre.

Inês Brasão é autora de «Hotel, os bastidores», um retrato publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.

 

O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor.

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